Acordo com meu próprio grito. Lágrimas no rosto. Era só um sonho. Era um sonho? Um pesadelo, penso. Eu não sei discernir o sonho do pesadelo, tão menos ambos do real, a vida acordada não tem sido tão melhor, concluo.
Enquanto eu dormia, lá no cerne do meu subconsciente tudo doía. Doía demais. Lembro ainda. E, geralmente, não lembro do que se passou em mim enquanto eu durmo.
Sei que, eu-real, assistia de uma cadeira privilegiada a dor do meu eu-onírico. Não sabia que, em qualquer tempo-estação-universo, eu poderia chorar com tanta força. Até porque na vida que me foi dada me tiraram, aos poucos, as lágrimas. Extra, extra: vejam aqui uma mulher que desaprendeu a chorar.
É uma escolha. O peso da lágrima é maior do que o da coroa que carrego. A primeira cai e me leva, a segunda sobe e me eleva. Não estou cá a me trazer à majestade, não fui eu quem me dei esse fardo-trono, não roubei essa parca coroa. Foi a realidade dos dias, foi minha cabeça erguida, foi meu poder de não desistência que me levaram à cerimônia.
Extra, extra (de novo): não percam a coroação invisível da rainha da periferia, dotada do poder do pequeno sorriso, da máxima gentileza, das palavras incautas, do cuidado cuidadoso, da imorrível esperança, da incessante tentativa em ser mais gente. Primeira de seu nome, majestade dos que nada têm, mas acreditam que o melhor está no porvir.
Sim, eu sou a rainha do meu mínimo reino, sou a capitã do meu navio, o espelho do povo que me enxerga. Eu sou meu próprio sangue correndo desesperado em minhas veias. Não posso parar, tenho muito o que fazer por mim, pelos meus e pr’aqueles que me esperam em vitória.
Eu, rainha de um reino besta, quase infame. Norteadora de uma pouca gente sem rumo. Líder de uns três ou quatro desdentados. Não importa, nada tira minha importância, muito menos minha coroa. Sigo, dia após dia, em batalha, acumulando derrotas homéricas e vitórias insignificantes.
Mulher à prova de balas, do santo forte, corpo fechado pelas orações da mãe que me pariu. Sou eu, o alvo que é a todo tempo acertado e nunca cai. Não deito. Sigo golpeada e de pé.
Alvo ativo. Eu atiro, atiro, atiro. Minhas balas têm alvo, não ricocheteiam, não lencam. Vão além, alcançam o alvo com facilidade, mas tenho pouca bala. Não é fácil, sabe? Ter tanta nobreza e tão pouco poder de fogo. Napoleão teria orgulho e vergonha de mim. Ora, teria sim. Me acharia um engraçado paradoxo.
Para além disso, eu ainda sou eu, respiro por meu próprios pulmões, caminhos com meus bons pés. Estou viva! Estou viva! Estou viva! Carrego minha coroa, finco minha bandeira esfarrapada, não me dobro e não permito que os meus se dobrem. Tudo está em seu tempo, posso renascer sob minha pele, com meu povo. É sempre daqui pra fora, é sempre daqui de dentro pro mundo.
Eu estou viva!