A maior missão de nossas vidas, pelo menos uma delas, acredito, é cumprir a sina de sermos quem, de fato, somos. Ao menos, quem desejamos ser. Penso que a profunda e complexa configuração do ser é fruto de algumas predisposições e uma infinidade de decisões.
Eu, por exemplo, trago esse riso frouxo e essa personalidade desassossegada lá do ventre da minha mãe. Essa tendência a cuidar do outro e o respeito aos demais, assim como honrar compromissos e valorizar o trabalho, meu e de todos, fui aprendendo em casa, no cotidiano da vida que me foi ofertada por Dona Divina.
Mas, consigo identificar, que, para além do meu sol em capricórnio e da minha lua em gêmeos, há construções em meu ser com minha assinatura. São as decisões que tive que tomar, a maior parte das vezes por necessidade.
Devido a realidade de pouco acesso que fui criada ao lado dos meus irmãos e irmãs, tive que aprender desde cedo a ser altiva, resistente e persistente. Eu poderia facilmente ter me tornado dura e amarga, seria, inclusive, justificável. No entanto, não aconteceu. Apesar dos pesares, sigo, irremediavelmente, uma criatura contente.
Trago uma bagagem gigante, arrasto-a, sem forças, grande parte do tempo. Sofreres acumulados, traumas não curados. Péssimas atitudes tomadas no furor da juventude, amores vividos e outros não. Equívocos mil e um sem fim de textos inacabados.
Eu, esquiva e astuta. Pagando o preço sem chorar. Sendo grata por todo tombo que levei e por tudo de bom que tenho ao meu redor. Acordando a cada dia e pedindo à vida, com muita fé, que me ajude a ser melhor “só hoje”.
Tenho tentado à exaustão cumprir o dever de ser quem sou. Orgulhar-me disso, sobretudo. Não é fácil, muito menos simples. Por mais consciente que tenha me tornado, as convenções sociais ainda me catam o calcanhar, me lançam ao chão impiedosamente. Passo um tempo ali, curtindo a impossibilidade de ser única e viver coletivamente, sinto a dor, levanto e a deixo lá. Logo, o riso bobo que me marca indelevelmente volta e segue fazendo de mim seu lar. Eu, casa da alegria.
Tenho trabalhado muito em mim. Em silêncio, aprendendo a calar quando devo e sem reclamar quando nada posso fazer. De marreta em punho, quebrando as concretas paredes do que não consegui elaborar. Com dinamites armadas, implodindo o ego que não permite que eu me supere.
Ansiosamente, queria passar para a próxima fase da vida. Aprender rapidamente os aprenderes. Viver os viveres. Me adiantar às experiências e ser logo a melhor versão de mim. Mas, não dá, ainda tem muito passado no meu presente e, desse jeito, o futuro encontra barreiras para chegar.
Eu, mulher de palavras, de apostos e vocativos. Mulher de pouco choro e de muito ofício. Mulher que luta para se construir melhor, pois é fruto que frutificou em mulher.