Segunda-feira qualquer, 6h20min, relógio despertando, me concedo o privilégio da soneca de 10 minutos. Levanto, sem escovar os dentes me sirvo uma imensa xícara de café e sento na varanda em silêncio, cara virada para o sol. Tenho minutos contados para refletir sobre a semana que se inicia, enquanto tomo um café mais forte que eu. Sinto pena do sobrepeso existencial que o café carrega: um líquido inocente ser responsável por tanta expectativa. Coitado!
Sigamos. Eu ali, a olhar para o horizonte ensolarado, buscando espírito superior que dê conta da semana atordoada que está no porvir. Semana cheia de rotinas e desafios de uma mãe solo, mulher trabalhadora. Ali, mergulhada no café e em planejamentos descabidos que nem uma super-heroína daria conta, tenho fé. Fé de que tudo dará certo, que conseguirei me manter digna enquanto criatura e gente que cria gente e é filha, amiga, irmã de outras gentes. Sobretudo, me preparo para ser sorriso largo perante a vida que é dura.
Os minutos do café se foram, corro pra aprontar a cria vaidosa para a escola e, agora sim, o dia começa. Rotinas de uma mulher que vê os quarenta apontar bem ali: vitaminas, suplementos, corrida na rua e treino. Não são nem oito horas da manhã e o mundo gira muito rápido do lado de cá da ponte.
Acho danosa a vida de mulheres como eu. O dia começa cedo demais e termina quando o dia vira. A conta não fecha, estamos sempre com um dia perdido, dormindo hoje, acordando hoje. Dá pra surtar, sim. Uma hora rola, quando tivermos tempo, acho. Vishi, vai demorar.
Todo esse esforço é porque eu tenho tentado. Céus, como tenho tentado. Acordo a bordo da expedição da mulher real. Ser boa mãe, boa profissional, boa pessoa e uma grande gostosa. Uma missão dessa beira à impossibilidade. Ou a ultrapassa, não sei bem.
Na verdade, pouca coisa sei, desconfio de muitas. Sem certezas, vou adiante. Sigo tratando todos como gostaria de ser tratada, com gentileza e muito respeito às identidades. Me calando quando devo, entregando sorrisos e conversas triviais, onde cabem. Distribuindo abraços e “eu te amo” quando o afeto transborda. E, me afastando quando lidar com minhas infinitas dores me consomem.
A questão é que buscar o sucesso do cotidiano, desenvolvendo múltiplos papéis é exaustivo demais. Em algum momento tudo se funde e se confunde. A criatura que quer educar, acaba por se perder na educação; quem deveria receber acolhimento, acolhe. O foco se dispersa num tornado de ações e reações dos dias de demandas infinitas. Tudo é feito e nada é providenciado. O dia se vai, a noite também. E ficamos desgastados tentando entregar nossa melhor versão. Minha terapeuta disse essa semana que eu só preciso dormir. Enquanto escrevo esse texto, assinto com a cabeça à fala dela, complementando: preciso dormir, sim, mas pelo menos umas duas semanas sem intervalo.