Dia desses, eu e minha irmã, numa conversa trivial sobre vida, amores e modos de amar, criávamos justificativas e procurávamos entendimento para alegrias e dores diversas. Eis, que dado momento muito oportuno ao papo, ela disse: o bom é quando o outro vai e só deixa saudade. Entendi totalmente o que ela disse, assenti com a cabeça concordando e uma eternidade se passou no segundo do meu silêncio de reflexão.
Essa frase adentrou em mim atravessando as barreiras das minhas experiências no campo amoroso como um supersônico, rasgando. Lembrei das vezes infindas que confundi sentimentos e me embananei toda, criando situações complexas onde bastava um sentir simples e proporcional ao que ali, sobre a mesa, estava posto.
Sabe, eu amo os amores dramáticos e complicados, cheios de complexidades, choros, risos e desencontro. Amo, mas somente nos livros e filmes. Na vida real é bom amar com direção, segurança e cuidado, muito colo e palavras bem ditas. No cotidiano é importante que o amor seja pacato, para que a vida siga em foco e sorrisos e, também, que seja bem plantado no coração de quem nos ama, pois é sabido que são as raízes que seguram as árvores ao solo.
A ausência física do outro dói, eu sei, mas geralmente o que dói mais são os conceitos que temos dos nossos sentires mais humanos. Saudade, por exemplo, não deveria ser sinônimo de falta. Se está em falta é que falta preencher-repôr-suprir e, se está nesse estado, é um alerta há mais que amor habitando o local. É que ainda precisamos falar muito sobre carência e autoestima, certo?
Não gosto de pensar que quem amo me falta, até porque como pode ser faltoso algo que me transborda, me supita, me arde? Como pode não estar aqui, se minha pele tem memória e nunca esquece do toque e de cada arrepio? Se o que se entrepõe entre meus olhos e a realidade é o jeito bonito e digno que sou observada por ele. Ah, quando se tem essa troca, essa confiança, essa tranquilidade, digo-lhes: estar distante fisicamente é condição superável.
A boa saudade não sufoca. Inclusive, onde se sentir sufocado não te demore, saia de fininho, mas com precisão, alcance o longe sem olhar para trás.
Retomando, a saudade, quando boa, vê nos dias que se vão longe do corpo do outro, tempo de cuidar, regar, esperar colheita próspera. A saudade, quando válida, dói no peito, mas não na consciência, não na dignidade, não na autoestima. A boa saudade não nos faz questionar índole ou atitudes, sejam elas nossas ou de quem confiávamos até então.
E, quando no peito, a saudade dói, é só desassossego, sinestesia, ebriedade emocional e desejo. Tudo é gostoso, não faz mal para ninguém.