Carolzinha foi um dos melhores sorrisos que conheci. Sorriso largo, pronto, sempre ali, estampado na cara dela. Grandes dentes numa criatura pequena. Tenho a impressão que ela era toda sorriso, fisicamente falando, dada a proporção. Ela era pura luz. ERA! Odeio me referir a ela como algo que passou. Odeio ter que encarar a realidade sabendo que Carolzinha não está mais aqui. Mas é a realidade, ela não está. Deixou esse plano para se tornar luz e estatística dessa pandemia infeliz.
Ela contraiu o vírus e foi se cuidar, dava notícias nas redes sociais. Sua última postagem foi para informar aos amigos e colegas sobre sua entubação. Disse, cheia de fé, que seria entubada por necessidade, mas que logo estaria bem, pedia orações ao final. Acreditou em sua melhora até o último instante, todos acreditamos, aliás. Infelizmente, ela não voltou. Deixou um vazio profundo em sua timeline e na vida que quem a amava.
Não éramos, de fato, muito próximas. Nunca fomos. Mas isso é indiferente. Estudamos na mesma faculdade, no curso de comunicação. Tínhamos amigos em comum e já tomamos uma cerveja – ou dez – nos bares do Distrito Federal. Nunca me esqueço de cruzar com ela pelos corredores e sentir a força daquele sorriso imenso que nos atingia como queda d’água em dia quente, bem refrescante.
Não é preciso ser próximo para se compadecer da dor do outro. Não é preciso ser amigo íntimo para sentir uma ausência. Não é preciso ser família para ter saudade de alguém que partiu. Não é. Basta ser gente. Basta sentir.
Da mesma forma, tenho sentido as ausências que a pandemia traz. Uma outra amiga de uma outra faculdade que fiz também foi arrancada de nós. Camila, uma professora comprometida, uma escritora incrível. Ela sonhava mais que a média de nós, queria um grande amor e almejava com todas as suas forças a maternidade. Encontrou seu grande amor, gestou uma criança que nunca pode acolher em seus braços, pois faleceu de covid. Duas mulheres que faziam desse mundo um lugar com mais dignidade para estarmos. Se foram, assim, sem ar.
Outras histórias de vida que circundavam a minha foram ceifadas: o moço que produzia e distribuía o melhor café que já tomei na vida. A mãe fitness da colega da infância. O motorista de aplicativo que morava próximo à minha casa. O vizinho que foi amigo da juventude do meu irmão. E por aí vai… Se esvai. Sem ar.
Tenho me mantido em estado de alerta, fazendo contas de contágio. Calculo o números de pessoas que cada um, próximo a mim, tem convívio e qual a porcentagem desses poderia estar contaminado. Naturalmente, não chego a nenhuma resposta real, racional. É que isso é desespero, não é matemática.
Depois de constatar que a única comorbidade existente em comum a todas as mortes ocasionadas pelo vírus é a fragilidade humana, temo por mim, por minha filha, por minha mãe e por todos aqueles que amo.
Em uma música, Chico Buarque disse que a dor da gente não sai no jornal. A minha sai. Olha ela aqui.