Nunca fui muito de acreditar no acaso. Por mais que algumas coincidências realmente aconteçam vez que outra a ponto de nos surpreender, sempre preferi acreditar na sincronicidade das coisas. O termo, batizado pelo fundador da psicologia analítica Carl Jung, refere-se à teoria de que esses sinais que recebemos vêm acompanhados de significados ou insights. Indo contra o seu fascínio por Freud, o jovem psiquiatra desviou da ideia de que “às vezes, um charuto é só um charuto” — e é aqui que me identifico: estamos rodeados de sinais prontos para serem interpretados.
Faz alguns dias que uma pessoa pulou para a superfície da minha mente sem nenhum motivo aparente. O último contato tinha sido há uns três anos, então trazê-la para o presente foi, no mínimo, curioso. Não retomei nossas conversas por acreditar que alguns vínculos são estritamente temporários, porém a vida aparentemente não pensa o mesmo. Hoje, durante uma conversa casual com uma amiga em comum, em meio à chuva de novidades que ela me contava, recebi a notícia que jamais imaginei: aquela visita inusitada de dias antes que invadiu a minha mente de surpresa havia se suicidado.
Inevitável lembrar dos dados que trago em minhas palestras: a cada vida perdida para o suicídio, cerca de 135 pessoas em seu entorno são impactadas. Instantaneamente, o meu pensamento sobre os vínculos temporários não só desapareceu, como transformou-se em uma verdade amedrontadora: não apenas estamos conectados por mais tempo do que pensamos, como também somos, sim, culpados por essa questão de saúde pública, sendo uma das que mais cresce nos últimos anos.
Já perdi pessoas conhecidas para o suicídio, mas desta vez a incredulidade me fez tampar a boca com as mãos e assim ficar, imóvel, durante um minuto. Além do fato em si, a ideia de ter relembrado aquela pessoa provavelmente no dia (ou quase isso) da sua partida me fez quebrar a cabeça em busca de um significado. Obviamente não o encontrei, porém continuo ao lado de Jung e sua teoria sincrônica. Por ora, ainda me perturba a ideia de que talvez uma mensagem minha mudasse alguma coisa. Aliás, até onde estamos aptos a mudar o destino?
Sendo o “daqui para frente” a única estrada a percorrer, o presente é um exercício para observar tais sincronicidades e seus significados — o que este sinal quer me dizer? Por mais que o aprendizado através da dor seja difícil, ainda temos um passado de referências que pode ajudar. Steve Jobs cravou: “você só pode ligar os pontos olhando para trás”. Então, para entender qual é o meu papel na vida de quem já se foi (seja ainda em vida, seja na morte), talvez o segredo seja relembrar quem um dia já fomos — e o porquê, sem muitos motivos, deixamos de ser.