Sempre achei preguiçosa a decoração das casas daqueles que escolhem pintar tudo de cores neutras. Cozinha branca, sala cinza, no máximo uma cor de madeira bruta em alguns cantos e só. Quando me mudei, uma das prioridades foi ter um escritório amarelo, um banheiro laranja e outro verde (até os armários da área de serviço têm cor diferenciada). Para mim soava um pouco desesperador viver em um ambiente tão apático, e durante anos eu consegui me identificar no meu excesso particular... Bem, ao menos até hoje.
Antes de começar a escrever, procurei pensar o porquê de cair na mesma vala que tantos caem depois dos trinta: a gente passa a se encolher aos poucos e assim nos escondemos dentro de nós mesmos. Não acredito que eu tenha me tornado uma pessoa fria, séria demais ou até mesmo sem graça. Na verdade, a melhor teoria que encontrei foi a de que aprendi, depois desse acúmulo de algumas décadas, a reparar no excesso dos outros que faz pesar o mundo.
Pode reparar: o mundo é um gigantesco caos. Mais do que nunca, qualquer direção que escolhermos para olhar vai nos trazer uma visão exagerada, extremista, gritante e por vezes até assustadora. Vivemos tempos onde precisamos, sim, das cores. Mas o “chegar em casa” é, também mais do que nunca, sinônimo de descanso. Ao menos, é o que deveria ser. Por isso o branco, por isso o bege, por isso o cinza cor-de-gelo... Estamos frequentemente exaustos.
Se olhamos para trás, a nossa infância foi pautada em livros e brinquedos estupidamente coloridos. O nosso quarto era colorido; a escola era colorida; o parque era colorido; tudo vibrava tanto quanto a energia de uma criança. Já adultos, as cores acabaram se perdendo não porque precisamos necessariamente vestir o fardo de sermos pessoas sérias e sem graça, e sim porque precisamos de algum tipo de alívio.
Quem sabe aquela expressão de “mundinho colorido” esteja fazendo muito sentido exatamente agora. De fato, não vivemos em um mundo assim, por mais que a gente se esforce em pintar todos os cenários possíveis para encorajar os mais pequenos de que a vida pode ser leve e divertida.
É um pouco triste reparar nisso, mas a culpa é totalmente nossa. Fomos nós quem criamos esse padrão de vida, fomos nós quem sustentamos diariamente a exaustão de exercermos os papéis sociais que nos são impostos. Somos nós quem perpetuamos essa cadeia cujo fim são as três latas de tinta preta que usei para pintar os bancos da minha sala de jantar – quando antes eles eram azuis, amarelo e vermelhos (coincidência ou não, exatamente as cores primárias que agora me faltam).