Eu matei um cactos. Quer dizer, não foi uma morte planejada, um tipo de assassinato totalmente frio e calculado. Mas eu acordei em uma sexta-feira qualquer e lá estava ele, Mortinho da Silva. Demorei um pouco de tempo para entender que essa era a sua real condição, até porque, eu nunca levei muito jeito como cuidador de plantas. Mas colocando as imagens do Google lado a lado com o meu espinhento, as referências me ofereceram a certeza: ele estava definitivamente morto (provavelmente há dias) — e de certa forma eu era, sim, culpado.
Um cactos! Mais especificamente, uma planta que sobrevive a desertos, caatingas e cerrados... Mas que não sobreviveu à minha casa.
Desta vez, nem perdi tempo tentando encontrar algo (ou alguém) que eu pudesse atribuir a culpa. Nada de "talvez tenha sido o clima úmido da cidade" ou "vai ver eu cuidei demais e acabei dando mais água do que deveria". Foi apenas um momento de aceitação: eu não tenho vocação para cuidar de plantas.
Não estou sendo dramático, eu juro. O meu histórico também inclui homicídio culposo de um bonsai lindo que ganhei de presente quando fui morar sozinho. Sei que depositei uma simbologia gigantesca em uma planta que não tem pretensão alguma de crescer além do espaço em que vive (o que é de uma humildade absurda, por sinal), e talvez essa pressão psicobotânica (inventei este termo agora) tenha obrigado o meu bonsai a tomar uma decisão necessária: se é para viver eternamente na casa desse cara, prefiro parar por aqui!
Certo, eu sei que o bonsai não pensou isso. Mas eu pensei.
E pensei porque não é de hoje que eu me questiono bastante sobre a vocação paternal que existe (ou não) em mim. Se existir, certamente ela age de modo tão lento quanto o meu metabolismo, mas isso é outro assunto e não vem ao caso.
Eu nunca quis ter filhos. Para ser sincero, acho uma das decisões mais corajosas que alguém possa fazer (e tenho algumas dúvidas sobre o mundo que estaria entregando a ele). Em contrapartida, desde pequeno alimento o sonho de ter um cachorro, mas ultimamente tenho notado que sempre existiu uma desculpa, independente do meu momento de vida. Por muitos anos foi a de que minha mãe é neurótica por limpeza (ela ama cachorros, mas não em cima do sofá), e depois, ao morar sozinho, foi a minha (falta de) rotina. Já no último ano, o cenário pandêmico parecia ser a situação perfeita para eu dedicar um pouco mais de tempo para um animal de estimação. Não rolou.
Resolvi então me tornar babá de aluguel dos cachorros dos meus amigos (na verdade, me autopromovi a dindo de todos eles). Eu funciono melhor com eventualidades do que com recorrências, sabe? Inclusive, eu sou ótimo! Já comprei até um jacaré de pelúcia para a Pug do meu amigo e recolhi o cocô do Poodle da minha amiga quando o levei passear. E a gente conversa bastante... Quase sempre sobre plantas.
Aos interessados, favor entrar em contato (e ignorar este título).