Há algumas semanas eu pedi por um sinal divino. Sabe quando a gente tem a impressão de que não entende o que fazer e a tomada de decisão soa como um fardo muito pesado para sustentarmos sozinhos? Pois é. No escuro do quarto, deitei na cama e encarei o teto para pedir (mesmo que em silêncio) por um sinal. É claro que dois minutos depois eu já estava atento, esperando por qualquer movimentação inusitada dentro de casa ou alguma trovoada do lado de fora. Mas nada disso aconteceu e acabei pegando no sono.
No dia seguinte, ainda nada. Entendi na espera que o lado ruim de pedir humildemente por um sinal é que nós não temos ideia de como e quando ele vai vir. E é exatamente nessa lacuna de tempo que passamos a questionar cada grão de poeira que está ao nosso redor, como se absolutamente tudo tivesse um porquê – ou, pior, como se tudo gritasse: ei, eu sou o seu sinal! Não foi você que pediu?!
Confesso que já tinha até desistido da empreitada quando, no final daquela tarde, minha casa quase foi invadida por dois urubus gigantescos (é sério). Corri a tempo de fechar as janelas, caso contrário eu teria saído porta afora e deixado o apartamento de herança para eles sem problema algum. Contudo, o desvio da dupla foi rápido e fez com que eles pousassem no parapeito da sacada da vizinha. Levou algum tempo para eu entender que não eram corvos nem pássaros mutantes, e eu até precisei tirar fotos para verificar com alguém mais inteligente depois.
Eram urubus. E, bem... Você sabe o que o Google diz sobre urubus.
De imediato, fiquei desesperado. Logo depois, lembrei que sou teimoso e gosto de duvidar até do Google.
Segui em frente com minhas pesquisas porque o olhar daqueles urubus não mentia: eles estavam ali para e por mim. E era hora de descartar qualquer crença, religião ou ceticismo para acreditar que, se eu havia pedido por um sinal, seria burrice recusá-lo. Assim, não demorei muito para encontrar o real significado por trás dos urubus – e, sim, ele é bem diferente das tradicionais lendas que estamos acostumados (o que me permitiu respirar tranquilo novamente, aliás).
Com meu sinal em mãos, agradeci a todos os envolvidos, mas principalmente a mim mesmo. Achei justo comigo dedicar uma parabenização especial por ter compreendido que aquilo era o que eu esperava, e que era dever só meu significar a cena (vai por mim, não faz mal sermos gratos com nós mesmos). O problema da história toda foi que eu absorvi tanto a lição que passei a enxergar uma mensagem em tudo: no galho da árvore que quebrou exatamente quando eu pisei na calçada, nas três placas de carro que terminavam com o número 7 que enxerguei no trânsito, na cinza da bituca de cigarro que despencou da janela do vizinho e voou com o vento das nove horas da manhã de primavera, e por aí vai...
Foi uma chuva de sinais. Antes de enlouquecer, então, lembrei do que Freud disse: “às vezes, um charuto é apenas um charuto” – e fim de história. Simples assim, tanto quanto um fio de cabelo preso no ralo do chuveiro que é só um fio de cabelo e nada mais. Mas os meus urubus... Ah, sim! Eles foram o meu sinal... E da próxima vez prometo que vou deixá-los entrar.
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