De tanto que gosto de História, vez em quando me pergunto para qual período eu gostaria de viajar, se fosse possível uma jornada como na série O Túnel do Tempo. Suponho que essa fantasia não seja só minha — é bem capaz que quase todo mundo a tenha. Minha escolha é sempre múltipla. Na real, eu adoraria passear um pouco por todos os períodos históricos. Tenho fissura pela Grécia Antiga, e lá certamente ficaria mais tempo. Também sou fascinado pela Idade Média, mas a passagem por ela seria curta, porque eu teria pressa de ver surgir o Renascimento e, a seguir, o Iluminismo, já na Idade Moderna.
Engraçado que o Renascimento, ao reavivar temas da antiguidade clássica, somente confirma o quanto me atrai a velha Grécia. E até o Iluminismo, ao exaltar a razão e fazer brilhar a ciência, também vai beber da ancestral fonte grega. Hum, percebo agora que gosto mesmo é do pensamento claro e reflexivo. Meu elemento predominante é o ar, e me afino com o conhecimento e com o humanismo. E com a liberdade, é óbvio. Aliás, na possibilidade de uma viagem no tempo, eu só embarcaria com a cabeça de agora. Sem essa de me transportar à Idade Média e pensar como um local medievo.
Mas será que temos a melhor cabeça de todos os tempos? Parece correto imaginar que o tempo presente, ao computar todas as vivências pretéritas, seja indicativo de maior lucidez e sabedoria. Era para ser assim. Mas não é. As evidências mostram que a humanidade costuma regredir também, em tudo, embora creia no mito de uma evolução contínua generalizada. Eu mesmo vivo achando que a nossa espécie, depois de tantas trombadas nos desatinos, sempre vá preferir a rota da paz, da fraternidade, do amor, da vida — tudo o que constrói, enfim. Qual o quê!
Li certa feita que o mito do progresso ascendente e irreversível é consequência do Iluminismo. Faz sentido. Desde o século XVII, ao despertarmos para a luminosa soberania da razão, pusemos freio no obscurantismo religioso e na ignorância. Livre para criar, o engenho humano saltou alto, pleno e feliz. E vieram invenções e descobertas, sempre vertidas em tecnologia e em mais qualidade de vida. Até passamos a viver mais, a domar doenças antes incuráveis. Como não entronizar o saber? Como não crer que o futuro seria sempre promissor?
Mas cá estamos, nesse presente em que a tecnologia reina, a comunicação atinge níveis nunca antes imaginados e tudo parece submetido à capacidade humana aparentemente inesgotável de controlar a vida. Trágica ilusão! O mito do progresso não nos deixa ver o que perdemos nessa sanha de crescimento ilimitado ao sabor dos mercados. Não nos deixa dar o devido peso à destruição ambiental causada por nosso estilo de produzir. Nem nos permite constatar o quanto estamos cada vez mais infelizes, solitários e vazios. Será mesmo que é a lucidez que nos guia?
Sem precisar viajar no tempo, eu evoco dos velhos gregos a visão simbólica dos quatro elementos que nos constituem, somente para lembrar que, além do ar, também somos fogo, somos terra, somos água. E desvendar os mistérios do mundo emocional da água talvez seja nosso mais urgente desafio — para curar nossos ressentimentos, reconhecer nossas carências e alucinações, acionar nossos saneadores afetos e reavivar a compaixão sufocada pelo individualismo cínico.
Em meio a hordas delirantes optando pela ignorância, clamando por ridículos salvadores enquanto adoram os bezerros dourados do mercado, não vislumbro futuro nenhum. É, amigos, a razão sumiu! Num túnel do tempo, que se faça a fila dos mais urgentes candidatos ao divã do Dr. Freud.