Nunca entendi o ciclo de florescimento das orquídeas. Na semana passada, a orquídea que fica na mesa da cozinha lá de casa estava exibida e exuberante. Ontem, a mesma planta dava sinais de abatimento, flores murchas, desidratando-se. Não sei se as flores duram até amanhã.
Ontem vi o melhor vídeo do ano. Informativo e irônico. Não cita flores, apesar de falar do Dia dos Namorados. O professor e historiador carioca Luiz Antônio Simas é um cara que flerta entre a boemia, por meio de revelações intelectuais à mesa de um botequim, com a mesma desenvoltura de quem pesquisa e escreve livros e artigos sobre a cultura brasileira, da filosofia popular às religiosidades. Sem falar de flores, Simas começa o vídeo com o bordão que é uma de suas marcas:
— O Brasil não é para principiantes.
Realmente, sinto-me um principiante, um amador diante da orquídea que definha. Dizem os especialistas que as orquídeas passam, resignadas, por um período chamado de dormência. Para mim, ao vê-las secar carrego o peso da iminente morte. Nunca sei se o melhor é ficar assistindo às flores secas despencando lá do alto da planta, naturalmente adubando a terra, ou se eu deveria cortar o caule desidratado, abreviando sua dor. De todo modo, sempre que começa esse tal período de dormência fico pensando na terra seca e árida, no desterro da orquídea definhando na minha cara.
Falando em deserto, assistindo ao vídeo do Simas aprendi que o Dia dos Namorados, no Brasil, foi uma invenção (e uma baita jogada de marketing) da Associação Comercial de São Paulo, em 1948. O pai da peça: João Doria. Também conhecido como pai do João Doria Junior, ex-governador de São Paulo. Enfim, pensaram ser a melhor ideia do mundo a criação desse mote, justo na véspera do dia de Santo Antônio, o Casamenteiro. Contudo, apesar de um bom motivo para aquecer as vendas, não se deram conta de que 12 de junho é dia de Santo Onofre.
— O Santo Onofre, na tradição católica, é o grande eremita do deserto, o casto, o solitário, o homem que passou 60 anos no deserto do Egito, sem ter contato com qualquer pessoa, em voto de castidade, no silêncio, em nome do amor a Jesus Cristo — ensina Simas.
Já diria Cartola: “as rosas não falam”. Ainda bem, mestre. Porque as rosas — e todas as castas de flores que dançam nas mãos dos namorados em 12 de junho —, com certeza dariam gargalhadas por conta dessa ironia do destino. Porque as flores, desde o final do Século 4, quando Onofre trancafiou-se em si mesmo, solitário no deserto, sabiam que 12 de junho é o dia do santo da castidade, o eremita, o antissocial do deserto.
— É uma maluquice deliciosa — diverte-se Simas.
Maluquice é perceber que as orquídeas não morrem porque é Dia de Santo Onofre, o Casto, nem tampouco desabrocham no Dia de Santo Antônio, o Casamenteiro. As orquídeas adormecem porque nos ensinam que a beleza da vida não está nas flores, mas no vigor da seiva. Enfim, uma lição de amor.