Camila e a fidelidade à essência
A empresária e estilista caxiense Camila De Zorzi, filha de Gilberto De Zorzi (in memoriam) e Suzete Stumpf De Zorzi, alinhava com a coluna um papo reto sobre sua vida e carreira. Graduada em Moda pela Universidade de Caxias do Sul, Pós-Graduação em Negócios de Moda, pela Faculdade Getúlio Vargas e Especialização em Bordados pela Maison Lesage, em Paris. Nossa entrevistada do dia, que é mãe de Enzo De Zorzi Chebar, recentemente trocou o exercício de suas atividades no Rio de Janeiro por Santa Catarina.
Qual look foi marcante e inesquecível entre tua infância e adolescência? Foi inesquecível quando aos 10 anos de idade eu mesma criei meu vestido para a Primeira Comunhão.
Qual é a sua história com a moda, como começou e por que decidiu seguir por esse caminho? Descobri meu fascínio por esse mundo quando aos seis anos, acompanhava sempre minha mãe na Boutique Dedé e eu escapava para a sessão de vestidos de festas, que sempre me chamaram a atenção. Os detalhes manuais das peças que fazem toda diferença em um look. Logo me encantava quando via minha mãe usando a linha e agulha para pregar os botões das camisas do meu pai. Um encontro do destino no elevador com minha querida vizinha Maria Lucia Gravina fez aumentar minha paixão por trabalhos manuais, pois ela me ensinou a bordar. Desde criança o meu interesse era totalmente voltado para a moda através de brincadeiras, então foi um processo que aconteceu naturalmente.
O mergulho profundo no universo da moda se deve a este histórico pessoal? Com toda certeza tiveram muitas pessoas que me inspiraram muito, mas considero um chamado da minha essência.
Quanto importante foi a experiência da graduação e o que pode compartilhar a respeito desta trajetória? É a base técnica fundamental para exercer com sabedoria a profissão. É um mercado muito dinâmico em termos de tecnologia e a atualização precisa ser constante.
Como se deu tua transição na produção de acessórios para as coleções de moda com a tua assinatura? Foi quando estava grávida do Enzo, e tive um tempo para refletir sobre minha volta ao trabalho, e me dei conta que o que mais gostava de fazer nas bolsas eram os bordados e outros detalhes manuais. Então dei início ao novo projeto que seria de criar e produzir bordados para as principais grifes do país. Essa troca foi incrível e aprendi muito com as equipes de estilo. Em seguida, veio a oportunidade de criar uma linha de abayas bordadas para o Oriente Médio e só depois lancei minha marca de roupa.
Como funciona o seu processo criativo, desde a pesquisa até a concepção dos modelos? Inicialmente, é um olhar interior para que estou vivendo e sentindo naquele momento. É muito intuitivo. A partir dai, incluo pesquisa de referências que façam sentido com o tema da coleção e crio os bordados, para depois decidir tecidos e modelagens.
O que significa fazer moda e como isso reflete na sua vida pessoal? Concretizar as minhas ideias aliado á geração de empregos é um negócio que me dá muito prazer. Ver o resultado de tudo isso na satisfação das minhas clientes, não tem preço.
Quais conselhos daria para quem quer ingressar nessa profissão? Treine seu olhar. As inspirações estão nos lugares mais simples que existem. Os dias glamurosos serão muito poucos, observe se você tem prazer nas tarefas corriqueiras e difíceis do dia a dia. Faça contas antes de apostar em um modelo.
Trabalhar com a mão de obra do Sul e do Rio de Janeiro também promoveu um elo entre as culturas? Como é esse processo? No início foi feito com a mão de obra do Rio de Janeiro e de Minas Gerais. Com a abertura da loja de Jurerê, em Santa Catarina, iniciei o processo de busca no Sul e estou descobrindo artesãs igualmente boas por aqui. Algumas peças são costuradas no Sul e beneficiadas no Sudeste.
Dentro da sua produção, como surgiu a oportunidade de desenvolver peças para o Hijab-Se? No Brasil não existem muitas opções para o mercado muçulmano e a Hijab-Se me procurou para unirmos forças para produzir uma coleção juntas. O resultado está sendo surpreendente.
O que pauta tua novidade intitulada “Bordados Protection”? Trazer espiritualidade e leveza para as roupas em um momento delicado como o que estamos vivendo.
O que considera que são mitos da profissão? Futilidade. Moda é expressão e o reflexo do seu interior. Além disso, é uma das indústrias que mais geram empregos no mundo.
O que é ter estilo? Ser fiel à sua essência.
Quais os seus trabalhos ou projetos preferidos? Um deles foi durante a Semana de Moda Gaúcha, realizada na Dado Bier, em Porto Alegre. Para o evento, desenvolvi tramas com linhas sobre redes de pesca. Além deste, desenvolver todas as coleções é um desafio fascinante.
Como enxerga a cena de moda contemporânea no Brasil? Vejo uma moda menos autoral e mais comercial, pois não há espaço para aventuras nos dias atuais. Observo também as marcas preocupadas com a responsabilidade social e ambiental.
Qual a importância da sustentabilidade nesse meio? De extrema importância. Procuro sempre fornecedores que têm responsabilidade ambiental e social. Por exemplo trabalho com paetê reciclado de garrafa PET. Mesmo tendo um custo maior dou sempre preferência para materiais reciclados.
De que maneira nota que o cenário atual está afetando o mercado da moda, e como isso vai impactar no futuro? Acho muito importante termos um olhar para a sustentabilidade, esse é um caminho sem volta. Tudo precisa ser pensado para não ter desperdícios e os retalhos de produção terem um destino. Nós doamos para oficinas de aprendizes, e acabam virando tapetes e pequenos artigos. Além disso, adoro dar cara nova às peças que cansamos no armário. Os apliques são a prova disso. Tiramos de um vestido e dá a cara nova a uma jaqueta, por exemplo.
Quais são as suas referências na área? Quem são seus ícones? A natureza e fonte inesgotável de inspiração. Admiro Ronaldo Fraga, Karl Lagerfeld e Jeanne Lanvin.
Busca estabelecer relações no seu trabalho com outras áreas, como design, arquitetura, arte? Muito. Transformo todas essas áreas em referências para minhas coleções.
Quais são os seus planos para o futuro? Quero continuar criando as minhas coleções de forma bastante estruturada, mas não deixando de lado a qualidade de vida que vim em busca aqui no Sul. Há longo prazo, pode ser que retorne com a minha marca para vendas no atacado.
Se pudesse voltar à vida na pele de outra pessoa, quem seria? Entre meus erros e acertos, gostaria de voltar eu mesma para a colheita das minhas decisões.
A melhor invenção da humanidade? Avanços da medicina.
Gostaria de ter sabido antes…que não se deve sofrer por antecedência.
Qual a passagem mais importante da tua biografia e que título teria se fosse publicada? Ter me tornado mãe. “A Melhor Experiência da Minha Vida”
Livro de cabeceira? O Poder da Kabbalah, de Yehuda Berg.
Um hábito que não abre mão? Passear com o cachorro da família. É nesse momento que eu e meu filho temos as melhores conversas.
Uma qualidade: amorosidade.
Um defeito: sou pisciana e passo boa parte do tempo em outra dimensão.
Uma palavra-chave: paz.