Nos últimos anos, movimentos de conscientização estão despertando as pessoas no sentido de perceberem e rechaçarem um dos maiores absurdos a macular a nossa condição de humanos: o racismo. À luz da razão, é simplesmente vergonhoso sustentar qualquer argumento que tente justificá-lo. Considero-o uma das maiores violências praticadas contra o outro. Não encontro palavras para expressar o mal-estar e a tristeza dentro de mim ao me deparar com isso. Quando ele se manifesta é como se houvesse o retorno a um estado primitivo, tendo a lucidez cedido para a ignorância em estado bruto. Deparei-me poucas vezes com tal situação e em todas fiquei em choque, reagindo como pude na tentativa de mostrar ao agressor o horror de tal comportamento. Vivemos, em maior ou menor grau, numa sociedade segregacionista. Felizmente evoluímos bastante, mas o caminho pela frente ainda é longo. Leio o texto de um colunista da Folha de São Paulo e fico emocionalmente prostrado. Um amigo dele, com doutorado na Alemanha e ocupando o cargo de CEO numa multinacional, é constantemente abordado pela polícia. Seu crime? Ter a pele negra. Da última vez o lamentável episódio aconteceu diante de seu filho de dez anos. Imagino o desespero desse pai, impotente e paralisado, pois uma reação física ou verbal poderia causar a sua morte. Apenas um caso entre inúmeros registrados diariamente no país.
A mentalidade escravocrata parece persistir dentro de um grande número de criaturas. Ignoram a palavra respeito, definindo o caráter de alguém a partir da pigmentação da epiderme. Fico me perguntando como, a despeito da evolução dos costumes e do acúmulo de conhecimento, podemos manter viva uma realidade que causa tanto sofrimento. Verdade seja dita: carregamos em nosso DNA os resquícios de um tempo de discriminação, época em que os imigrantes expressavam sem se constranger sentimentos de superioridade em relação às demais raças. Em especial os afrodescendentes. Nos Estado Unidos essa barbárie parece atingir dimensões estratosféricas. Relatos evidenciam o quanto nos situamos longe de compreender o significado das palavras direito e liberdade. Como se pode pensar dessa maneira? Consigo entender uma série de posturas, mesmo as diametralmente opostas às minhas. É um exercício de conscientização do que é determinado pelos limites da individualidade. Fico pensando: estamos no século 21, mas sob certos aspectos nem parece.
Nossa condição se apequena diante destas constatações. Ao menos agora pode-se promover uma discussão, que antes era impossível. Mantenho a esperança de que as próximas gerações olhem para o passado e possam dizer: já é assunto superado. Até lá, façamos um ato de contrição, reconhecendo que muitos, talvez em tom de brincadeira, contribuíram para a manutenção desse estado lamentável. A perversidade também responde pelo nome de omissão.