“Para tudo há o preço de ter e de não ter”, escreveu o cientista Labouriau, em suas memórias. A vida corre em linha reta e são tantas as vezes em que nos surpreendemos pensando: Se tivesse feito uma escolha diversa, como eu estaria hoje? Em que teria me transformado? Uma indagação talhada para cair no vazio, pois em sua impossibilidade de resposta há uma série de variantes difíceis de alcançar. Ganha-se e perde-se. Somos um amálgama, resultado das consequências de cada escolha feita e que passará a definir a nossa essência. Ficamos com um travo de amargura quando essa interrogação nos assombra. De fato, nada nos garante uma existência plena ou a supressão de certas angústias se tivéssemos nos desviado do caminho trilhado. Teríamos recebido mais amor, tido amplo sucesso na carreira profissional, os amigos seriam parceiros fiéis? Nunca saberemos. A balança manteria seu equilíbrio com elementos diferentes, mas sem nos garantir uma cota profusa de felicidade.
Devemos crer tacitamente: damos o melhor em grande parte das situações emblemáticas. Isso deve nos encaminhar para a serenidade. Deixemos de lado as conjecturas vãs, destinadas ao fracasso. Colocar uma lupa sobre o positivo, nas experiências solares, nos proporciona paz de espírito. O problema se acentua se olhamos ao redor e começamos a comparar. Sempre haverá alguém mais rico, bonito ou inteligente. Mas quem dirá se há neles a sensação de regozijo? Deparei-me com pessoas aparentemente afortunadas e, mesmo assim, eram assombradas por um sentimento de inquietude, de desconforto. O que, para outros, seria um pacote completo de benesses, pode simplesmente invalidar o nascimento da gratidão. O descontentamento faz parte da geografia interior dos humanos. Aninhá-lo em nós em determinado período é quase inevitável. Porém, a maturidade deve expulsá-lo da alma, sob o risco de adoecermos emocionalmente.
Também fui vítima dos ardis da mente durante um bom tempo. Penso ter me curado da ferida ao estabelecer laços profundos de intimidade. E comecei a ter essa percepção: independente do que temos ou como nos definimos, raros são os seres agraciados com a satisfação incondicional. Bendigo os passos que me levaram até aqui. Resulto de cada ação praticada, pois me conduziram onde cheguei. De forma consciente ou nem tanto, acredito ter internalizado a lição estoica: só algumas coisas podem ser controladas e é preciso distinguir se estão ao alcance de mudança ou não. Nada me assevera que encontraria saciedade me desviando de algo, pois é constitutivo da minha personalidade. Algumas sombras pairam discretamente sobre mim, mas as impeço de anularem o meu propósito de aceitação, escapando de uma série de conflitos. Colho exultante os frutos de cada estação. E permaneço me vigiando.