Enquanto espero a chegada do elevador, converso com uma simpática senhora. Entre uma amenidade e outra, ela me diz estar bastante adiantada para a sua consulta, pois tinha muito medo que chovesse, levando-a a sair de casa bem antes. Enfatizou seguidas vezes esse seu temor, “exagerando” como seria difícil se deslocar se isso acontecesse. Enquanto a escutava, observei seus traços fisionômicos e presumi que ela teria aproximadamente setenta e poucos anos. Depois de nos despedirmos, lembrei da minha sessão de terapia, na manhã desse mesmo dia. O foco foi a necessidade de ficarmos atentos às mudanças comportamentais provocadas pela passagem do tempo. E à redução das capacidades físicas também. Se não fizermos considerável esforço no sentido de tentar preservar o entusiasmo e o gosto por viver, estaremos fadados a ver a vida sendo invadida por uma série de temores, a maioria deles imaginários. Não sei como será comigo, mas já sinto certas sombras se aproximando e tento me tornar consciente da necessidade de uma vigilância emocional permanente. O que se revelava fácil adquire contornos de gravidade. É preciso redobrar alguns cuidados, pois o corpo se torna frágil e a mente pode preparar algumas armadilhas.
No entanto, vejo em homens e mulheres bem idosos um vigor admirável. E em todos eles o gosto na permanência de uma atividade profissional e da socialização no centro de sua existência. A tentação de parar, o desejo do descanso tão sonhado pode induzir à busca da inatividade, como um lenitivo para as décadas anteriores, quando o trabalho ocupava grande parte do cotidiano. A biologia costuma falar mais alto, em muitos casos. Há um cansaço natural que se instaura em nós. Se descuidarmos, os diálogos girarão em torno de bulas e doenças e aí, inevitavelmente, fadigaremos nossos interlocutores. Sempre achei possível desviar-se desse roteiro tão presente, mas para isso devemos avivar o interesse pelos relacionamentos, pela arte e, sobretudo, o propósito de cultivar amizades. O acomodamento nos espreita e pode tomar proporções imprevistas. Envelhecer não é sinônimo de entrega e passividade. Há de se continuar renovando o ímpeto de manter acesso o impulso pelas novidades. E a propensão de deixar de lado coisas menos relevantes que outrora. Se ficou difícil continuar fazendo caminhadas de cinco quilômetros, poderemos encontrar o mesmo prazer reduzindo o percurso. Comer um churrasco tarde da noite? Talvez uma ideia a ser revista, pois pode ter chegado o momento de ingerir comida saudável e leve, cautelosos quanto à quantidade e horários adequados ao organismo.
E se chover? Vamos assim mesmo, lembrando da brevidade de tudo. Arriscar-se com prudência, eis uma maneira inteligente de gastar as horas que vão minguando. Sejam elas vibrantes.