Quando nos encontramos, ele faz relatos de situações difíceis e complicadas pelas quais passou. É um drama ambulante. Nunca opta pelo caminho mais fácil. Busca até encontrar diversos empecilhos, talvez só para depois dizer: “Foi terrível, você sequer tem uma vaga ideia do que enfrentei.” Sinceramente, acho certa graça em suas descrições. Elas são teatralizadas, sempre com toques dramáticos. Parece sofrer e se divertir com isso, pois consegue a atenção da plateia, e deve ser esse seu intento. Mas em algumas situações me exaspero, pois faço parte do time que procura simplificar as coisas. Carrego essa impressão: o excesso de atividades, as exigências profissionais e a necessidade de estarmos cada vez mais informados acaba gerando esse olhar de aflição frente aos desafios apresentados em nosso cotidiano. Tudo vai se sobrepondo com estonteante velocidade e sinalizar aos outros como a vida se tornou complexa é uma maneira de se proteger. E, concomitantemente, um atestado de que, mesmo em condições adversas, constatamo-nos capazes de superar as provações em meio à jornada. Evidenciar um quadro complexo, quase intransponível, mostra a força e a tenacidade necessárias para sairmos vitoriosos. Esses arranjos internos nos permitem seguir adiante com uma autoimagem tinindo.
Entendo. Porém, não há como deixar de analisar a questão sob outros ângulos. Somos o resultado das interações feitas com os demais e cercar-se de gente excessivamente passional e inclinada a um bom teatro parece ser uma opção ruim. O diálogo reto, objetivo, nos conduz a conclusões claras e funcionais em qualquer circunstância. Eu ajo assim: se fico confuso e me perco em devaneios, convido um amigo para um café e, contando com sua gentileza e generosidade, solicito o empréstimo de um pouco do seu tempo. Invariavelmente tudo se desanuvia e vejo através de outros ângulos (bem menos complexos) do que estavam em minha mente até então. É um alívio seguir pela vida sem carregar tantas bagagens. Precisamos nos conscientizar: na maioria das vezes, as soluções tendem a ser bem tranquilas se nos dispusermos a respirar fundo e investigar o que nos incomoda.
Longe de posar de sábio, partilho um itinerário extremamente caro a mim. Cometo tropeços, mas, na medida do possível, evito subir ao palco para encenar algo. A clareza é fruto de uma investigação interior longamente cultivada. Para tanto, precisamos de humildade e reconhecimento dos erros. No mais, a resposta para terminar com as aflições costuma estar diante dos olhos, sem que consigamos perceber. Na dança da existência, podemos ser intérpretes de um tango ou de uma música de tons delicados, boa para relaxar o corpo e a alma. De certa forma, a escolha é pessoal. Tentarei dirigir com suavidade e clareza as próximas cenas. Tingir com cores fortes a existência já não é meu propósito.