Gilmar Marcílio
Você faz de tudo para acreditarem no que está mostrando. Escolhe um ângulo favorável, cuida da luz, repete a foto quantas vezes forem necessárias. A tela do celular transformou-se num espelho edulcorado da sua existência. Se for possível provocar uma “distorção positiva“, maravilhoso. Imagem, é preciso poli-la ao máximo. Parecer tem mais importância do que ser. É apenas o Instagram, mas para muitos, um caso de vida ou morte. Chegamos a esse ponto: trata-se de algo além da vaidade, uma séria disfunção emocional. Viciamo-nos em recompensas. Ouvi na semana passada uma analogia interessante. Num podcast de discussão sobre os efeitos da exposição excessiva nas redes sociais e na maneira como queremos nos apresentar, um analista de conteúdo disse estarmos vivendo algo já mostrado no livro O retrato de Dorian Gray, escrito por Oscar Wilde no final do século 19. A personagem faz um pacto com o diabo e seu envelhecimento só se manifesta em um quadro escondido a sete chaves no sótão da casa. Para a sociedade, ele continua eternamente jovem, imprimindo uma expectativa de perfeição inalcançável. Estamos buscando no mundo virtual algo bem parecido com isso. Oculta-se o que não nos soa bonito e cria-se uma utopia particular.
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