Passei grande parte da vida dividindo as pessoas em duas categorias: as boas e as más, genericamente falando. Deixei de compreender um fato importante relativo aos nossos pares: somos uma mescla de qualidades e defeitos. Dificilmente podemos encaixar em um único estereótipo. As circunstâncias vão determinando maneiras de ser a partir de nossa estrutura interna. Alguns se revelam verdadeiros crápulas em qualquer situação e outros se inclinam ao bem, despojados de interesses individuais e tendo em vista sempre o melhor para o coletivo. Mas não se constitui numa regra. Somos matizados, híbridos nas intenções e ações praticadas e é bom estarmos cientes para não buscar um ideal inalcançável. Precisamos invocar um olhar crítico e, ao mesmo tempo, de tolerância. Vale para amigos, colegas e amores. E, principalmente, para nós mesmos. Digo isso pois é comum nos vermos como eminentemente bons e dignos de servir de exemplo. Tantas vezes me surpreendi negativamente com minhas atitudes, pois deixei a racionalidade de lado, agindo com rompantes. Costuma dar errado. Para quem está disposto a se analisar sem reservas esse pode se configurar num excelente itinerário para o crescimento interior.
Observe: comumente gostamos de fazer julgamentos levando em conta os atos pregressos. Se agiu assim no passado, tudo indica que fará o mesmo agora. No entanto, é preciso acreditar na capacidade de reconstrução da própria identidade, na contenção de alguns impulsos, determinando uma nova perspectiva emocional. Sou otimista nesta questão. Sei das inúmeras resistências presentes na esfera do humano, mas também estou ciente da força de vontade que nos move quando um propósito nos acena. Conheci quem, por ter sido submetido a algum tipo de violência, passou a reproduzi-la em seu cotidiano. Ao encontrar alguém que lhe mostrou uma possibilidade diversa, alterou radicalmente sua forma de agir. Exemplos claros e evidentes se dão quando uma criatura solitária, desconectada dos demais, encontra uma âncora onde pode expandir o seu afeto. Testemunhamos transformações impressionantes. Ou seja, não se pode dar nada por perdido. E ser mais condescendente nos liberta de um maniqueísmo francamente descomprometido com a verdade.
A partir dessas constatações, estou tentando misturar diversos ingredientes antes de encaixar quem quer que seja em um conceito demasiadamente estanque. Quero ser bastante acolhedor e, se possível, encontrar reciprocidade. Tudo se torna agradável, leve. Flexibilizar, eis o caminho. Faço parte da turma que acredita na redenção e na capacidade de vestir a personalidade com roupagens diversas. Nosso bem-estar depende da qualidade dos relacionamentos. Esforcemo-nos, portanto. Basta apenas afastar os véus da incredulidade.