Uma crítica recorrente ao nosso tempo é essa: nunca foram escritos tantos livros ruins; filmes e músicas de péssima qualidade são produzidos a granel. Sem falar nas platitudes disseminadas nas redes sociais como se fossem aforismos destinados a se cristalizarem no imaginário das pessoas. Até certo ponto, convenhamos, é verdade. Mas, se você desviar um pouco o olhar, perceberá: temos um manancial de obras-primas à nossa disposição. Contemplo a minha biblioteca e tenho essa certeza: fracassarei no intento de, até o fim da vida, ler os romances e ensaios inicialmente pretendidos. A sétima arte nos legou trabalhos imortais, que podem ser vistos e revistos quantas vezes quisermos, sem perder o seu fascínio. Então, é mais uma questão de garimpar o que já se já “estocou” ao invés de passar as horas se lamentando. Claro, nossa convicção fica aguçada quando se debruça sobre o presente, mas não podemos abdicar desse exercício de ampliação da percepção, fazendo renovadas colheitas. O desejo de criar jamais se esgotará. Talvez aqui se deva dizer isso, em favor dessa visão negativa: poucos parecem interessadas em buscar o que transcende o momento. Em outras palavras, querem apenas o entretenimento.
Outro exemplo: para muitos, a palavra filosofia é só um eco longínquo. Algo que desperta a curiosidade de meia dúzia de iniciados, falando entre si numa linguagem cifrada, quase incompreensível. Faço essa consideração pois creio que, ao assimilar o legado dos grandes luminares do pensamento, começaremos a ser seduzidos pelo belo, pelo sublime. E aí, o passo seguinte será o de não nos satisfazermos com qualquer conteúdo despejado pelo mercado sobre nós como se fosse a maravilha suprema. O desenvolvimento de um senso crítico depurado nos leva, consequentemente, a escolhas aprimoradas, maduras. Seremos capazes de apreciar o que está permeado de densidade, legando-nos um rico material para reflexão. A capacidade de discernimento é um ato essencialmente político, pois nos conduz a decisões conscientes em diversos campos, extrapolando as humanidades. Seguidamente, por pura preguiça mental, nos deixamos conduzir e adotamos o senso comum. É uma atitude perniciosa à saúde da alma, pois gera contentamento com o pasteurizado, o superficial.
De toda maneira, antes de se queixar, dê uma espiada no passado. É imprudente relegar ao esquecimento o trabalho de homens e mulheres pertencentes à categoria dos gênios. O alimento está lá, desde as antigas civilizações gregas, romanas e egípcias. E, se vasculhar com cuidado, pequenas joias podem ser encontradas também agora, recém-saídas do forno. Aprenda a olhar seletivamente, aliando-se à minoria. O acesso à boa arte propicia o surgimento de lampejos de felicidade. Cultive-o. E, acredite: a inteligência continua andando solta por aí.