Havia um fundado temor pelo inverno. O inverno passou, e julho/agosto, confirmando as expectativas, revelaram-se o primeiro pico da pandemia. Com ambientes fechados, baixas temperaturas, o inverno encarnava as mais sombrias projeções. E de fato, passamos pelo inverno à custa de milhares de mortes. Que seriam inevitáveis, pois as pessoas morrem mais dia, menos dia, segundo o raciocínio de nosso presidente, ainda que tenham sido essas mortes aceleradas e antecipadas, a exigir até mesmo covas coletivas. Mas esses detalhes pareciam não fazer diferença.
A pandemia, no Brasil, chegou junto com o outono. E apavorou logo de saída. Foi o outono que serviu de cenário para o inimaginável, um quase lockdown na arrancada, pessoas dentro de casa, ruas vazias, condição que cansou quase todo mundo rapidinho, em duas semanas. E a pressão tornou-se irresistível, as ruas se encheram de gente logo a seguir, e assim estão até hoje.
A primavera, quem diria, que lá no início funcionava como um desaguadouro de esperanças, um prazo estipulado para a volta ao normal, pois a primavera frustrou expectativas e acolhe agora a chamada segunda onda, fortíssima. Pelo menos, o calendário primaveril está assinalando o começo da vacinação no planeta, mas isso é coisa lá para a Europa, o Reino Unido. Aqui, em sua lógica da contramão, nosso presidente coloca a ênfase de que vacina não pode ser obrigação. E sabe-se lá quando teremos, visto que a vacinação está anunciada em São Paulo para fim de janeiro, e são duas doses. Na venerada República de São Pedro, quando será?
Só falta o verão. Pois o verão bate à porta, daqui duas semanas. Como será o verão da pandemia? Teremos praias inacessíveis, como neste momento em solo gaúcho? Ou as pessoas com seus coolers levarão tudo por diante, na saga por um pedaço de areia, como já se viram trailers em praias brasileiras entupidas de guarda-sóis e pessoas sem máscara? Pelo nosso histórico na pandemia, é bem provável. Ou resistiremos de máscara nas cidades a calores escaldantes de 42 graus? Nessa hora, lembro Djavan, morrer de sede em frente ao mar. E penso também em UTIs cheias no verão, onde se morre de verdade, em profissionais da saúde esgotados ou em vias de esgotamento.
Não será simples a empreitada, que seguirá dramática. Num sopro de bom senso, será um verão sem shows da virada no Réveillon, sem trios elétricos, sem Carnaval na Sapucaí. Mas, por aqui, bem sabemos, somos dados às nossas façanhas. Gramado, por exemplo, estufou o peito e foi em frente, protagonizando o Natal Luz com a cidade cheia.
O verão deve ser inclemente, a testar ao limite nossa resistência. E só a vacina nos salva. Talvez venha no verão. Há, pelo menos, essa esperança.