Eu ando cansada, acho que você também. É só meio do ano, mas parece que já é um ano faz tempo. Talvez seja a natureza e seus desastres. Talvez. Talvez seja mesmo o ser humano e seu comportamento. Dizer que se está cansado é que tem sido cada vez mais difícil. É, porque vivemos tempos em que é preciso estar bem o tempo todo. Como se isso fosse possível. Não importa se o mundo está acabando, mas manter o sorriso e fazer de conta que estamos ótimos, sim.
Neste fim de semana vi uma imagem nas redes sociais que talvez exemplifique o que estou dizendo. Num determinado lugar se estava comemorando a festa de São João, muita alegria, dança e ao fundo a mata pegando fogo. Eu não sou contra a festa, de jeito nenhum, aliás sinto saudades de um bom arraiá, mas haveremos de concordar que a cena era, no mínimo, inusitada. Para não dizer, surreal. Me lembrou a cena do filme Titanic, enquanto o navio afunda, a orquestra continua tocando. Me pergunto se é uma tentativa de manter a normalidade. Ou seria alienação? Ou pior, uma normose.
Talvez o cansaço seja exatamente isto, esse exagero do que deveria ser, mas não faz mais sentido. Cansaço de ser sempre quem procura por argumentos plausíveis e científicos. Cansaço de procurar outras fontes seguras para desmentir as fake news. Cansaço de tentar explicar por um outro ponto de vista, sendo sempre a pessoa que flexibiliza enquanto a outra permanece presa as próprias certezas, muitas vezes ignorantes. Cansaço de tentar construir um diálogo sem ser atacado de alguma forma. Cansaço de ser mulher e sempre ter de ouvir bizarrices sobre o nosso corpo, nossa idade, nossas ideias, nossas roupas e comportamentos, sobre o que comemos. Cansaço de ser mãe e ter alguém por perto para ensinar a melhor forma de educar os próprios filhos. Cansaço do trânsito insano e imprudente que temos na nossa cidade. Como se dirige mal nesta Caxias do Sul. Cansaço de quem não entende nada sobre veganismo e fica vociferando recalques. Cansaço de amigos que não respeitam o limite da amizade e abusam até que seja necessário cortar relações. Cansaço de amores tóxicos, trabalho em excesso, chuvarada, pouco dinheiro, violência. Cansaço de ruas e ruas nesta cidade sem iluminação pública, do asfalto de péssima qualidade, de político que só aparece em tempos de eleições.
Não estou sendo pessimista. Dizia um velho amigo e poeta, estou sendo realista. Há um exagero de positividade em nossa sociedade que beira o patológico. Quando as coisas não estão bem, precisamos aceitar que estamos cansados. É este desconforto que abre uma brecha para repensar nosso cotidiano. Dizer que está tudo bem o tempo todo é uma aniquilação suave de si. A positivação do mundo faz surgir novas formas de violência. A dor e o cansaço são indícios de que não estamos bem, e precisamos fazer algo, se quisermos sorrir de verdade, até porque sorrir não poderia, jamais, ser uma obrigação.