Sempre haverá pelo menos dois caminhos a frente. Quase como se a vida fosse uma eterna encruzilhada. Hécate para os gregos, Trívia para os romanos, era uma deusa considerada guardiã das passagens, associada aos cruzamentos e encruzilhadas. Invariavelmente estamos diante de uma delas. Para que lado seguir? Qual o melhor caminho a tomar? Para além das angústias que nos atravessam diante de uma possível escolha, gosto de pensar que se chegamos numa encruzilhada é porque andamos. Somos uma espécie de andarilhos. Alguns são refugiados da própria história, outros foram deportados da vida que tinham antes, tornaram-se exilados, outros ainda são eternos errantes. Há os que perambulam de um lado para outro sem muito objetivo, os que são apenas curiosos e há ainda os que imigraram.
Volta e meia, entre um compromisso e outro, quando posso, saio para fotografar as ruas. Há uma beleza indizível nos ambulantes. Gente anônima e tão cheia de histórias. Fotografo e penso, afinal somos indivíduos ou parte da multidão? Qual parte nossa deseja se destacar dos outros e qual deseja misturar-se? Contradições. Atendi durante um tempo uma paciente gravemente doente e costumávamos fazer nossa sessão andando pelas ruas. Ela dizia que precisava de sol e eu sentia que o consultório era pequeno demais para o que estávamos vivenciando. Andávamos e ela me dizia da memória dos passos e de como seus pés entendiam a cidade melhor que ela mesma. Andávamos e pensávamos em voz alta, quem teria passado por ali antes de nós, o que cada esquina significava para cada pessoa e em como a cidade seguiria pelos passos apressados dos outros depois que ela partisse.
Andávamos atrás de vestígios de vida, texturas do passado, acasos felizes, reencontros depois de anos. Enquanto realizávamos nossa andança, percorríamos a vida, desatando alguns nós e decidindo sobre o concreto da morte. Como organizar a partida, como contar para os filhos, como apaziguar a dor e o medo. Andar pelas ruas era percorrer a tênue linha do destino.
Por que tomar uma decisão é tão difícil? Talvez porque saibamos que ao tomar uma decisão as alternativas se excluem. Talvez porque uma parte nossa tenha consciência de que para cada sim há inúmeros nãos. Talvez porque tomar decisões tenha mais a ver com renúncia do que com escolhas. Nossas decisões falam dos nossos limites, de até onde conseguimos ir. Quanto mais nos damos conta dos nossos limites, mais descobrimos nossas limitações. É um rompimento com a ideia de que somos especiais e por isso podemos ter tudo. Essa ideia de potencial ilimitado é falso. Se nada nos fizer compreender isso, o corpo e a idade darão conta de nos colocar em nossos devidos lugares.
Decidir é inevitável. Não podemos ficar paralisados por muito tempo. Em algum momento temos de escolher qual caminho seguir. Escrevo e penso na experiência que tive e fico com a sensação de que independente de qual caminho decidiremos seguir, o mais importante é escolher quem estará ao nosso lado durante a jornada. Seja ela de vida ou de morte.