É preciso parar um pouco. A vida nos engole feito onda. As pessoas se atravessam em nossas vidas com suas demandas, deixando as nossas para depois. Nos dilaceramos. Somos uma espécie de elástico e nos esgarçamos até quando podemos (ou até quando o outro acha que deveríamos). O perigo é perdermos a capacidade de voltarmos a nós mesmos. Daí surge o adoecimento. E pensar que às vezes aquela dor de cabeça, ou na coluna, ou no estômago está nos dizendo chega! Sim, porque se deixar por nós, estaremos sempre nos atarefando de mais alguma coisa. Talvez isso tudo seja resquício da cultura que prioriza o trabalho acima de tudo. No entanto, além de um tempo dedicado ao labor, que é extremamente organizador de nossas rotinas, ele também nos rouba tempo de outras possíveis facetas da vida. Além de se tornar um tipo de válvula de escape, para alguns. Afinal, enquanto se trabalha, não se precisa ser ninguém, além desse corpo-vazio, como diria Delleuze e Guatarri, que apenas produz. Um corpo sem órgãos, totalmente disponível para o capitalismo. Então um dia ele dói, aleluia. Uma dor para nos lembrar que somos humanos e que sim, nossa vidinha é miúda e insignificante diante da eternidade das pedras. Até porque a natureza toda, de certo modo, estará sempre aqui, enquanto nós estaremos apenas por alguns míseros anos. Isso deveria servir para nos assustar e nos fazer perceber o quanto somos pequenos diante da vida. Mais, deveria nos aproximar das coisas que nos fazem feliz. Todo mundo busca a felicidade, que longe de ser um exagero é ainda algo tão estereotipado.
É quase fim de ano e parecemos estar numa ressaca que não passa nunca. Fiz uma lista de possíveis descansos a partir da possibilidade de sair deste modo mais operacional e respirar um pouco como pessoa que somos. Começo com a sensação que precisamos tirar uma folga da imbecilidade que nos rodeia. Chega de flertar com o perigo da insensatez. Precisamos superar o inconformismo, afinal em um determinado momento é necessário crescer, deixar de ser crianças birrentas e malcriadas e compreender que o mundo é muito maior que nosso umbigo. Chega de bandeiras que tremulam nas sacadas, elas nos lembram do quanto andávamos à deriva. Carecemos de nos afastar da anestesia diante dos fatos que têm acontecido. Esse sucessivo massacre de violências e omissões têm gerado pessoas insensíveis. Precisamos de um descanso de jogador de futebol comendo carne com ouro na Copa. Isso é de uma grosseria e insensibilidade sem tamanho. Não basta ostentar, tem que mostrar que ostenta. Chega de amigos que se acham no direito de impor suas opiniões. A base da amizade é a capacidade de amar o outro, mesmo o outro sendo diferente de nós. É urgente um descanso para os ouvidos das mulheres que estão cansadas de ouvir opiniões sobre seus corpos. Precisamos descansar da cultura bélica que nos rodeia. Chega de racismo, mas para isso, já dizia Ailton Krenak, precisamos terminar com a precarização do trabalho.