O modo como você ama é o seu sintoma. Amar calado, amar em dor, amar em sofrimento, amar com raiva, amar às escondidas, amar aos gritos, amar ferindo, amar se deixando machucar. Amamos do modo como aprendemos a ser amados. O amor é um chão de terra batida em que pisamos a todo momento. Nossos pés se sujam desse amor. Amor em pó ou em lama. É pelo modo de caminhar de conhecemos como o outro ama. O jeito com que pisa nesse chão, se consegue ficar de pé, se aceita outras pegadas em seu espaço, se chora ou se distrai. Amar é aceitar que o outro chega também com seu próprio pisar. Alguns chegam e ficam pelos cantos, outros querem ocupar o espaço principal do território-vida. Alguns querem amar, mas querem manter-se limpos o tempo todo, esquecem que amar é lambuzar-se sempre. É no amor que nossas feridas narcísicas se abrem. Ao amar circulamos pelo pó, lama, saliva e sangue. Não é possível amar de modo asséptico. Para amar é preciso andar descalço. Mesmo que o chão tenha espinhos.
O chão de terra batida é a casa da infância. Amamos aprendendo a ser amados. Sim, as primeiras pessoas que nos ensinaram sobre o amor são nossos pais, avós, tios, dindos. Depois os amigos e os professores. E o coletivo. E numa instância mais profunda e complexa, em terapia. Mas todo o momento é momento para aprender.
Já dizia Drummond, que pode uma criatura senão, entre criaturas, amar? Como se amar se desse num estalar de dedos. Quem não quer ser amado? Desejamos tanto amar alguém. Mais. Desejamos ser amados por alguém. Alguém que nos veja, nos sinta, nos aceite do jeito que somos. Alguém que nos queira do tamanho que desejamos querer. Que preencha a imensa falta que sentimos. Desejamos alguém que nos roube de nós mesmos. Que nos arrebate. E aí, a coisa se complica.
Carregamos em nós uma fantasia de que um dia encontraremos alguém que nos livrará de nós mesmos. Buscamos alguém que diga algo sobre nós. Algo que ainda não sabemos, ou achamos que não conhecemos. E o outro já chega em nossas vidas com uma demanda. Por isso também, a fantasia amorosa e completamente fictícia de que o outro nos completará. A falsa ideia da outra metade da laranja ou tal encontro de almas gêmeas.
Demoramos para entender o que é amar. Amar é uma fruta que madura no seu tempo. E às vezes, não madura nunca. Mas esse é um tempo contado para dentro. Não é o tempo cronológico. Pode-se viver anos com uma pessoa e jamais conhecer o que seja amar. O amor, ao contrário do que imaginamos, não nos preenche. Na verdade, ele nos devolve para nós mesmos. No encontro com o outro nossa sensação de falta se potencializa. Descobrimos que a parte que nos falta, jamais será preenchida. Amar é ser devolvido à própria solidão. Que o que há, são instantes. Amar é andar pelo nosso chão de infância. É aceitar o encontro com o desamparo, com as ilusões, com a nossa imaturidade e com o desejo de amar mesmo assim.