Somos tão esquisitos. Todos nós. Queremos tanto amar mas odiamos quem pensa diferente, sente diferente, quem é o diferente. Queremos tanto um mundo melhor, mais humano, mas somos os primeiros a julgar e brigarmos por qualquer coisa. Dizemos que acreditamos em Deus, mas somos materialistas e apegados ao dinheiro. Amamos os animais, somos defensores da causa, mas comemos vacas, porcos e todo tipo de bicho que pode se transformar em bife. Nos dizemos pessoas sonhadoras e que em nossos corações pulsa o desejo de uma sociedade que pense mais no coletivo, mas não conseguimos dividir a calçada com o carroceiro sem xingar ou criticar. Fazemos ioga, meditação e mesmo assim nosso pensamento de macaco salta de galho em galho de modo obsessivo envenenando nossa mente um pouco mais a cada dia. Queremos parecer de bem com a vida mas não suportamos a ideia de estarmos envelhecendo. Dizemos eu te amo, mas desqualificamos a pessoa amada. Postamos fotografias nas redes sociais sorrindo, mas na verdade estamos tristes e solitários.
Não é que devemos ser de um modo ou de outro. Na verdade, somos deste jeito e deste outro também. Mas por vezes há um excesso de ambiguidade como se dentro de nós houvesse um algo que nos puxa para um lado e um outro algo que puxa para o outro. Nos esgarçamos feito elásticos tentando segurar as duas pontas extremas. Quase dilaceramos. E essa sociedade que nos cobra um rigor de personalidade alimenta nossas fragmentações. Não há um único modo de ser, mas sermos de modos tão díspares, como se partes nossas não pertencessem a mesma pessoa, requer que nos autoquestionemos, afinal, quem somos?
É preciso que a gente possa se dar conta que talvez o MEIO disso tudo seja o único lugar possível, pois estamos sempre no meio. No meio do caminho, no meio de uma discussão, no meio da vida, no meio de uma decisão, entre os pais, entre amores. Nossos entremeios. O meio é o espaço da dúvida. A dúvida é o lugar do não saber. O não saber não é o caos. É no meio que o pensamento acontece. É no meio que a gente se encontra.
A vida é feita de rugosidades, dobras, torções. Às vezes é macia, doutras, áspera. Querer viver somente na luz é negar a importância da umidade de nossos porões. Estar sempre na sombra é aproximar-se demais do abismo. Pelo meio cruzamos desertos e inundações. Aprendemos a nos proteger do sol incessante e descobrimos modos de não nos afogarmos. Às vezes nos debatemos demais dentro de nossas cabeças com coisas que fora dela não fazem o menor sentido. Conseguir voltar para o MEIO e questionar-se é descobrir que precisamos deixar de ser infantis e parar de tropeçar em nossos próprios cadarços.