Sejamos a favor.
Pelo menos uma vez.
Larguemos nossas velhas ideologias, nosso sofá confortável, nossos sonhos mais pueris. Sejamos a favor das abelhas, do pequeno agricultor, das árvores, das sementes que não são transgênicas, da terra sem agrotóxico, das águas seguirem seu curso, dos pássaros que cantam como se o humano não fosse real.
Sejamos a favor dos sem dinheiro para o gás, para a passagem, para o mercado, para a classe média (que fede, como dizia Cazuza). Sejamos a favor do artista de rua, que pinta a cara e o corpo, que brilha no sinal de trânsito, que não cobra nada pelo espetáculo e ainda tem de lidar com a pressa dos importantes que morrerão como eles, mas talvez menos felizes. Sejamos a favor das mulheres que não querem ter filhos porque nem todas nasceram para ser mães. Sejamos a favor dos homens que desejam ser pai, cuidar da casa, dos filhos e do fogão, pois há neles um princípio de mãe e isso os torna nos homens que precisamos para fazer a revolução. Sejamos a favor dos estudantes que por lucidez emperram as engrenagens do sistema, enchem as ruas, gritam com coragem e têm os olhos selvagens. Sejamos a favor dessa juventude que clama por mudança, que acredita num futuro melhor, que ergue seus cartazes e nos chamam para o coletivo. Sejamos a favor dos velhos que ainda se arriscam a sair de suas casas e a circular pelas ruas. Eles nos ensinam a ter paciência e a certeza de que um dia seremos nós a viver a invisibilidade da velhice e o esquecimento que vêm com a morte.
Sejamos a favor das criaturas que ainda plantam flores, há nessas pessoas uma espécie de esperança louca de que algo bom brote no ser humano, como se ao semear a terra fosse possível sonhar. Sejamos a favor da possibilidade de dançar a hora que se deseja dançar, com ou sem música, sem que isso pareça coisa de quem não regula bem. Há vezes que ser “desregulado” nos faz mais feliz do que viver dentro do quadrado ao qual somos moldados e, justamente por isso, adoecemos, pois é preciso se dar conta de que a vida segue adiante diminuindo os dias e um dia, será tarde demais. Sejamos a favor dos sorrisos sem causa. Há dias em que, por breves instantes sentimos a felicidade nos invadir e é preciso que possamos nos dar conta disso, porque o resto do tempo é de raiva, tristeza e solidão. Sejamos a favor dos que se vestem como querem se vestir, dos que não se importam com a opinião dos outros, dos que desejam apenas amar sem que o amor esteja aprisionado a um corpo ou a um sexo, dos que acreditam em Deus esteja ele dentro do corpo de Cristo, de Buda, de Krishna ou de uma árvore.
E que a sociedade, o governo, a política não nos possa mais ignorar nem se esconder atrás de uma retórica vazia. Não queremos mais promessas. Somos a favor do respeito a nossa inteligência, aos nossos desejos, a dignidade humana e a ética. Não somos esboço de vida. Somos a vida e a vida dura o tempo de um raio que rasga a noite. Por isso, sejamos a favor de alimentar a todos, com comida, poesia e informação.