Você já parou para prestar atenção nas coisas que fala? Geralmente, porque estamos sempre dizendo algo, pouco paramos para nos ouvir. Entre sentimentos, afetos e palavras há um discurso que vai sendo tecido ao longo de nossa vida. Falamos muito dos outros. Falamos muito de nós. Falamos mais ainda dos outros. E falamos sobre nós. Mas falamos o quê?
Na maioria das vezes a nossa fala é acusatória. O outro está sempre errado, não presta, não é uma boa pessoa, é cheio de defeitos, sofre menos do que eu, tem mais do que eu, mas deveria ter menos, é feio, é gordo, é incompetente, é falso, é, é, é, é. E assim, infinitamente apontamos o dedo para o outro, o grande responsável pelas nossas tristezas ou pelas coisas não darem certo. Fazemos julgamentos a partir da nossa posição, expectativa e visão, sem levar em consideração que podemos estar sendo superficiais, maldosos e altamente onipotentes. Não nos damos conta, ao agirmos assim, que estamos reforçando, no mínimo, duas situações: a primeira de que nos colocarmos numa posição vertical diante do outro, como se de alguma forma, fôssemos superiores (o que não é verdade); a segunda, é a de que, aos poucos, mas cada vez mais, afastamos as pessoas de perto de nós. Sim, porque é insuportável estar perto de alguém que, de uma maneira ou outra, espalha pólvora por onde passa.
Por outro lado, quando não estamos julgando o outro, estamos nos autojulgando. Apontamos o dedo para nós mesmos e nos autocriticando fortemente. Não nos damos conta, mas podemos estar sendo muito cruéis conosco mesmos. Duvidamos da nossa capacidade, nos sentimos inferiores, incompetentes, fracassados. Carregamos uma vergonha enorme de não correspondermos ao que os outros esperam (geralmente os pais). Nos sentimos com medo, ansiedade e passamos a procrastinar para (na tentativa) de não errar mais ainda. Nos sentimos feios, desajeitados, fora da curva. Sem perceber, mastigamos a raiva feito fumo, mas ao invés de jogar para fora (de um modo saudável) engolimos esse fel todo. Não há fígado que consiga metabolizar tanta amargura.
Independente de apontarmos o dedo para fora ou para dentro e aqui sempre lembro da frase, “quando Pedro fala de Paulo, sei mais de Pedro do que Paulo”, penso que temos de parar de apontar os dedos. Dedos foram feitos para acarinhar, pegar, acolher, semear, plantar, digitar textos, tocar, não apertar gatilhos, sejam eles reais, concretos ou psíquicos. Tentar mudar o modo como dizemos as coisas e, principalmente, o conteúdo de nossa fala é tão difícil quanto mudar de alimentação, bem sei. Mas extremamente fundamental, porque a crítica dura e os rótulos ofensivos não ajudam ninguém a progredir ou a se sentir melhor.
Praticar a gentileza consigo mesmo e com o outro não é poesia, é dever. É percebermos que somos (todos nós, vou repetir, todos nós) incompletos, imperfeitos e inconstantes. E que dar-se conta disso, nos tira da posição ilusória de sermos melhores ou piores. Somos pessoas e, justamente por isso, somos divinamente humanos.