A gente não precisa ter todas as respostas para ser feliz. Não precisamos ter opinião para todos os assuntos, porque seremos vistos muito mais como chatos do que como entendidos. Não precisamos beber toda a garrafa de vinho para se soltar numa conversa ou ter coragem. Ao contrário, a coragem é um varal esticado onde penduramos nossas peças mais íntimas e justamente por isso, nem todos precisam ver. Não precisamos dormir um dia inteiro para recuperar uma insônia se tentamos entender por que ela nos visita sempre. Nem precisamos comer até ter de dormir sentado porque queríamos aproveitar ao máximo. Não precisamos viver de máscara o tempo todo, mas usar sempre que for necessário. Não precisamos trabalhar o tempo todo, seja lá qual motivo for, mas nem estar de férias a vida inteira. Não precisamos ficar dizendo eu te amo a todo instante, nem ficar postando fotos de amor para os outros verem, principalmente se realmente estamos satisfeitos. O amor é silencioso, se grita demais é outra coisa. Não precisamos ler todos os livros, mas ler em profundidade. De nada adianta ler em pencas e esquecer tudo. Não precisamos de dias azuis e calor sucessivos para dizer que o tempo está bom. Os últimos dias têm nos mostrado que nem sempre céu limpo é o melhor. Não precisamos preencher nosso dia com mil afazeres. Espaços cheios demais não deixam respirar, além de acumularem muito pó.
De vez em quando é preciso tirar os sapatos e andar descalço. O chão tem uma pedagogia própria. É preciso deitar no chão da cozinha de barriga para cima e saber que dali não passamos. Afinal, o tombo tem a nossa altura. É preciso ouvir os passarinhos, mesmo em meio ao barulho de carros, pois que os pássaros falam a língua da infância perdida. É preciso tomar banho gelado. A água fria nos dá sempre um choque de realidade. É preciso olhar menos as redes sociais e mais o relógio. A vida voa. É preciso sentar-se com o próprio tédio e aceita-lo. O tédio nos ensina a ser criativos, se tivermos paciência. É preciso lembrar que a alegria, assim como a tristeza, só são sentidas nos intervalos da vida. Coisa boa. Como diz Winnicott, psicanalista inglês, quando nos damos conta de que estamos no meio, bem no meio. Entre o antes e o depois. Isso significa que estamos no agora. E o agora pode ser alegre ou triste. E ele vai passar também, porque a vida acontece em fluxo contínuo.
Provavelmente nunca estaremos plenamente satisfeitos, mas nem toda falta dói. Uma vida de fantasias pode ser mais desejada, mas não é real. A realidade pode ser vivida, se aceitamos viver. Afinal, nem toda folhagem floresce e nem por isso deixa de ter sua própria beleza