E se nós fôssemos uma espécie de biblioteca, que tipo de livro você seria? Qual seria a sua capa? Teria ilustrações? E, o principal, que tipo de narrativa contaria? Se a sua vida pudesse ser contada como se fosse um livro, qual seria o gênero? Romance, drama, poesia, contos ou um livro infantil? E qual título ele teria: a solitária, a sonhadora, o menino que não gostava de usar meias, a garota que se escondia embaixo da mesa, um homem que envelhece, uma mãe que precisa de férias, a criança que queria envelhecer, a mulher dos sapatos vermelhos, o cara que não consegue ser pai, o filho autista, a mulher que sofre violência doméstica, a bipolar, o melancólico? Cada um de nós tem uma história para contar das coisas que já viveu.
Dias atrás recebi de uma amiga querida uma notícia sobre um projeto que já percorre vários países, chamado biblioteca humana. O projeto que completa agora em junho 21 anos de atividade, nasceu em Copenhague, na Dinamarca. A proposta é contar e ouvir histórias de personagens vivos, promovendo a diversidade e a tolerância. Afinal, quantas vezes julgamos o livro pela capa? Quantas vezes julgamos o outro pela aparência? Quantas vezes queremos contar o que nos atravessa e não temos com quem falar ou então, quantas vezes gostaríamos de ouvir o que o outro tem a dizer sobre algo que nos interessa?
Na base há a conversa, o diálogo (ou a falta dele). Quando nos permitimos conversar, na dialética do falar e ouvir, não só conhecemos a outra pessoa, como passamos a nos (re)conhecer. É ouvindo o som da própria voz e as coisas que dizemos que vamos nos dando conta de nossas angústias, medos, cobranças, sonhos. É ouvindo(se) que praticamos o ouvindo(si), no sentido de ouvir o si. E quando deixamos o si que há em nós encontrar o si que há no outro, nos tornamos menos chatos, menos julgadores, mais empáticos, afrouxamos os nós que nos prendem a uma imagem fixa de si e dos outros. Vivemos e conforme vivemos, mudamos (ainda bem).
No projeto, que sempre acontece dentro de bibliotecas, as pessoas são “alugadas” por 30 minutos e neste tempo contam de si. Contam de suas dores, alegrias e penso que toda vez que alguém abre espaço para que possamos nos contar uma vez mais, percorremos o mesmo caminho de nossa narrativa de vida, mas observando coisas novas. A fala é um local de encontro consigo mesmo e com o outro. A fala é um refúgio, um espaço onde sossegamos as ansiedades. Mas é no ouvido que (re)construímos nosso enredo, dando significado a nossa jornada.
O projeto da biblioteca humana pode ser acessado pelo site humanlibrary.org. E você, tem uma história para contar? Que tipo de livro você seria?