Há dias que nos faltam palavras. Como se estivéssemos acorrentados a algo difícil de explicar. Encontrar uma palavra que expresse o que se passa conosco transforma-se em uma urgência. É preciso falar para sair do confinamento. Para sair desse espaço alienante que insiste em nos engolir. Quando falamos criamos a realidade. Ou nos desacorrentamos dela. Mas nem sempre a palavra repara e é aí que nos sentimos sendo atravessados pelo mal-estar. É neste naco de tempo que nos escapa que sentimos a impossibilidade de ser. E não é fácil acordarmos e descobrimos que não somos, que há muito tempo tentamos ser e que talvez nunca consigamos. Eis a falta. Por mais estranho que isso possa parecer é justamente neste ínterim que podemos algo. Há dias que precisamos nos deparar com esses buracos para que possamos nos dar conta do quanto vivemos uma vida engessada, endurecida, fixada. Nos debatemos com nossos pensamentos insistentes, com nossas angústias e ansiedades, com nossos medos e fantasias, então, acordamos e estamos no vazio. Então percebemos que estamos vivendo uma vida claudicante e parece que chegamos no limite. Não dá mais, dizemos. Decepamos as palavras, jogamos na guilhotina os sentidos, ficamos à deriva. Neste momento, é preciso que tenhamos coragem para não nos fechar em nós mesmos. Embora seja tentador. É preciso vencer essa fronteira e deixar escoar o que sentimos. Deixar deslizar para fora de nós aquilo que nos paralisa. Não importa se você não sabe o que é, basta que sinta e deixe sentir. Aos poucos as palavras voltam a ter som.
Há dias que as palavras tornam-se prisioneiras, como se ao calá-las pudéssemos reivindicar a liberdade. Construímos em nós autoverdades e nos isolamos. É preciso resistir a si mesmo e organizar uma insubordinação palavreira, invocar vocábulos, arregimentar preposições, libertar orações, frases, parágrafos, colocar o discurso em marcha. O silêncio é fundamental, mas nem sempre é bom. Nem sempre temos de nos calar. Nem sempre o silêncio é construtivo e traz reflexão. Às vezes ele é um agente torturador, vigia de algo inumano que ainda não passou. Então é preciso des-amor-daçar as palavras. Sair deste amortecimento. Deixar escoar o sentido do não dito. Temos medo de falar. Medo de falar de si mesmo para o outro, medo do que o outro fará com nossas feridas. Mas às vezes é preciso conseguir dançar em meio a vertigem, conseguir deslocar-se no redemoinho da vida. Octávio Paz afirma que quando aprendemos a bailar com as palavras e sua potência poética improvisamos nosso salão inóspito do entendimento de quem somos.