Vilson Becker Gehring, 64 anos, estava trabalhando na lavoura no interior do Ibirapuitã, no norte do RS, em 22 de agosto, quando algo chamou sua atenção: era um balão azul já com pouco ar, pendurado em uma cerca da propriedade rural. Ao pegar a borracha, veio a surpresa: o balão trazia uma mensagem vinda da Argentina.
— Estava indo para a lavoura de trator e enxerguei o balão. Na curiosidade, li o bilhete mas não entendi, só vi que era espanhol. Só tinha visto coisa assim na televisão, de balão que vai de um país para outro. É isso, são coisas que a gente solta e não têm rumo — relata.
A história veio à tona com a sobrinha de Vilson, Catiane de Almeida Avila. A mensagem no balão chamou a atenção e ela pesquisou as informações que vinham no texto na internet. Foi aí que descobriu o endereço e as redes sociais de uma escola que comemorou o Dia das Crianças na Argentina, em 20 de agosto.
A instituição é de San José de la Esquina, comuna com 7,2 mil habitantes da província de Santa Fé. Na ação da escola, as crianças escreveram o que desejavam ganhar na data comemorativa e prenderam o recado em balões. Todos foram soltos no ar — e um deles voou 1.272 quilômetros, até Ibirapuitã.
— Já estou em contato com o pessoal de lá e estamos nos organizando para enviar uma caixa de presentes para a Valentina, a menina que enviou a mensagem. Vamos mandar brinquedos e a maquiagem, que ela pediu, e folders que contam a história de Ibirapuitã — contou.
Não é a primeira vez
Em 1986, o agricultor Eloy Calegari, agricultor vizinho à propriedade de Vilson, também se deparou com algo parecido: ele fazia a colheita do trigo no mês de novembro quando, no meio da lavoura, se deparou com os restos de um balão vermelho.
Ao pegar o balão, encontrou uma mensagem escrita em espanhol com desenhos de pomba, coração e uma flor. Estava escrito: "Mensagem de paz", em espanhol, junto com o endereço e um número que parecia ser de telefone do remetente: Marco Andrés Quintana.
— Até pensei que fosse uma mensagem daquela Farc [Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia], porque falava de paz. No fim nem fui atrás para ver de quem era, mas guardei o bilhete. Agora, o vento trouxe outra. É bastante coincidência — disse Eloy.
Correntes de jato de ar impulsionaram balão até o RS
Para chegar a Ibirapuitã, o mais provável é que o balão tenha sido impulsionado por uma corrente de jato de 4 mil a 5 mil metros acima da superfície, explicou o meteorologista e pesquisador do Centro de Pesquisas e Previsões Meteorológicas (CPPM) da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), Henrique Repinaldo.
Segundo ele, em níveis mais baixos as correntes são mais fortes e vêm do Paraguai para o Rio Grande do Sul. Da região de Santa Fé, na Argentina, os ventos teriam de vir do oeste e sudoeste.
— O balão deve ter subido bem algo para chegar em Ibirapuitã, no norte do Estado. Acredito que ele tenha ficado em 4 mil a 5 mil metros de altura e foi levado por correntes de jato, provavelmente a 100 km/h. Isso é bastante possível e, como o balão se movimenta com a corrente, conseguiu resistir a essa velocidade — explicou.
Apesar de serem feitos com material mais resistente, é comum que organizações soltem balões meteorológicos para medir as variações atmosféricas. De modo geral, eles chegam a até 12 mil metros de altura e estouram à medida que sobem. Mas, nesse caso, o mais provável é que o balão viajou por uma corrente de ar estável, o que o manteve no mesmo nível por mais tempo.