Um projeto único, que leva formação, acolhimento, escuta e troca de experiências até as mulheres que moram nas ocupações de Passo Fundo. O Projeto Ocupar: Mulheres, terra e luta, nasceu em 2019 com o objetivo de fomentar o protagonismo de mulheres que não eram vistas pela sociedade e pelos próprios territórios, onde não tinham espaço de decisão.
Fazem parte do grupo, mulheres das ocupações Valinhos 2, Vista Alegre, Bela Vista, Valinhos I e Leão XIII.
De lá para cá a participação foi se multiplicando e atualmente cerca de 40 integrantes se encontram mensalmente na sede da Associação da ocupação Valinhos 2, construída pelos moradores, a partir de um projeto executado por alunos do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Passo Fundo (UPF).
Além dos encontros de formação e troca de experiências, elas sentiram a necessidade de acolhimento e escuta por parte de profissionais como psicólogos, já que o tema da violência começou a ser levado ao grupo. Assim, duas profissionais, uma psicóloga e uma assistente social, se disponibilizaram a ir até o local uma vez por semana para ouvir as mulheres de forma individualizada.
Elas explicaram que o atendimento não tem intenção de ser um espaço de terapia, mas uma experiência de escuta.
— Quando o ambiente é de vulnerabilidade, isso acaba sendo mais fortalecido. Percebemos essa questão como um indicador importante para pensarmos a questão da violência contra as mulheres, potencializando elas para que compreendam e fortaleçam espaços de luta para saírem desse processo todo de violência. Estamos aqui para ouvir o que a mulher tem o desejo de trazer — explica Mariana Malaquias, psicóloga que atua de forma voluntária.
As coordenadoras do grupo são as primeiras escutas dos territórios, porque são elas que estão perto quando alguma violência acontece.
— Nós pensamos a parte da escuta por conta de uma pesquisa que fiz na minha graduação sobre clínicas públicas de psicanálise, que atendem pessoas em praças públicas em outros estados. Pensamos em trazer a psicologia para o consultório, mas as pessoas não tem dinheiro nem mesmo para a passagem de ônibus, então optamos por dar a possibilidade de levar o serviço até elas — fala Mariana.
A assistente social, Silvana Ribeiro, disse que a ideia foi criar um espaço pensado pelas próprias integrantes, desde a nomenclatura, até os objetivos e causas centrais.
— Imaginamos que esse seja um projeto-piloto no país. Desconhecemos movimentos de ocupações mobilizados por mulheres — afirmou a profissional, que representa a Associação Beneficente São Carlos.
Aos poucos as próprias mulheres foram se organizando e criaram uma coordenação. O grupo foi em busca de apoio estrutural e financeiro e profissionais foram se somando à iniciativa, entre elas a assistente social Silvana, a psicóloga Mariele Malaquias, a internacionalista com especialização em gestão de projetos, Mariana Bilac, a professora Claudete Gardino, a advogada Anna Gabert, as pedagogas Stefani de Lima e Edivânia Rodrigues, que também é educadora popular.
O apoio financeiro chegou no começo de 2022, a partir de uma parceria com a Associação São Carlos, dos padres Scalabrinianos, que atua no país com migrantes e presta apoio integral ao projeto, por compreender que as mulheres são também migrantes, vindas de outras localidades do Rio Grande do Sul, de outros estados e de outros países. A Associação já trabalhava desde o começo com o grupo e hoje também fomenta a busca por mais recursos.
Silvana explica que um dos grandes objetivos é pensar o lugar da mulher nas ocupações urbanas, pois historicamente estes espaços são coordenados por homens.
— Há um número de mulheres maior do que de homens nestes locais, então nos questionamos sobre se elas estavam exercendo seu protagonismo. Em 2019 começamos fomentar o poder das mulheres dentro das ocupações urbanas e construímos na ocupação Valinhos 2 um grupo que coordena essa ação, que depois teve mulheres de outras ocupações que se somaram ao grupo.
A sede, construída pelos moradores da ocupação Valinhos 2, ainda precisa reparos e banheiros, e deverá servir também como espaço coletivo onde as pessoas possam fazer festas em datas comemorativas para as crianças, de aniversários entre outras atividades.
Apoio e acolhimento no grupo e na escuta
As profissionais inverteram a ordem natural e, propiciando escuta e acolhimento, mudaram a realidade de muitas destas mulheres.
É o caso de Maria Luíza Santos da Silva, de 60 anos, residente na ocupação Bela Vista. Integrante do grupo desde 2019,que relatou se sentir acolhida e apoiada.
— Sempre trabalhei muito e nunca tirei um tempo para mim. Fico esperando pelo dia em que tem encontro. Trouxe minha irmã, convidei amigas, porque acho maravilhoso esse espaço, me ajudou muito em tudo. Estou passando por uma fase difícil e me sinto muito apoiada no grupo.
Por viver em locais com falta de estrutura, sem energia elétrica, rede de água e saneamento, as mulheres demandam serviços de assistência social e as profissionais fazem os encaminhamentos para os espaços de atendimento no município, como os Centros de Referência em Assistência Social e Conselho Tutelar.
O grupo ainda pretende criar um espaço social destinado às crianças que acompanham as mães nos encontros.
Apoio ao projeto
O projeto está aberto para apoiadores financeiros, sejam pessoas físicas, empresas ou entidades. Ainda busca mais profissionais voluntários e estudantes que possam contribuir com os atendimentos de psicologia, assistência social, advogados, pessoas que atuem na criação de projetos, entre outros. A intenção com isso é aumentar o número de mulheres atendidas.
Um dos parceiros é o curso de Design Gráfico da Universidade de Passo Fundo, que está construindo a parte estética do grupo e da luta pela moradia. Outro parceiro é o curso de música da instituição.
A intenção é lançar, até dezembro deste ano, um documentário com narrativas e vídeos a partir de gravações feitas pelas próprias mulheres e por voluntários, com cenas dos territórios, que mostrem seu cotidiano, com cenas da vida real. O projeto está aberto para a participação de faculdades, universidades e profissionais que tiverem interesse em contribuir.
Conheça o Grupo: https://www.instagram.com/ocupar.pf
Contato: (54) 99950-8934 - Silvana
GZH Passo Fundo
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