Conhecido como antigo moinho, o prédio onde hoje fica o Hub Aliança guarda um pedaço da história de Passo Fundo. O espaço recebeu parte da produção de grãos do norte gaúcho por pelo menos 50 anos, entre as décadas de 1930 e 1980, e teve participação direta no desenvolvimento da região. O novo projeto, que integra empresas e ideias inovadoras manteve a estrutura original e recuperou essa importante parte da história.
As passagens foram construídas para facilitar o escoamento da produção de feijão, trigo, milho e até soja, que aos poucos ganhava espaço nas plantações gaúchas. Ali ficavam esteiras para transportar os sacos de grãos e um vão de circulação de funcionários e pessoas aptas a fazer a manutenção dos equipamentos.
Ao todo, eram dois túneis: um aos fundos e outro na parte da frente do prédio de armazenamento e processamento de grãos. O frontal fazia ligação com o moinho ao lado, enquanto a hipótese é que a outra passagem fosse um caminho alternativo à estação ferroviária, a atual Estação Gastronômica da Gare. Até o momento, é impossível saber o traçado percorrido com exatidão: os dois acessos foram concretados e não há documentos para aferir o tamanho dessas passagens.
— O túnel de acesso pelos fundos do moinho foi concretado depois da construção de uma edificação nova no lote que fica na divisa com o silo. Já o túnel frontal, onde estão as esteiras e maquinários, foi preservado, mas não há como entrar no prédio pelas passagens subterrâneas. A única forma de acessar é através das escadas internas — explica o arquiteto Jacson Casalli, que trabalhou no projeto de revitalização para implantar o Hub Aliança no local.
Projeto inglês
Fechados há pelo menos 38 anos, os túneis eram comuns nesses tipos de construção para facilitar o escoamento dos grãos. No caso do moinho de Passo Fundo, o projeto seguiu os moldes da estética fabril da Inglaterra do século 20, com padrões de aberturas simétricas.
— Era algo comum, faz parte do conceito construtivo dos prédios daquela época. Os túneis são uma tecnologia desenvolvida há muito tempo. Hoje, praticamente todos os silos são metálicos, então o conceito de construção mudou bastante, mas naquela época era bem comum fazer a ligação por essas passagens — afirma Casalli.
O filho do antigo proprietário, Mário Iaione, desceu até os túneis com GZH Passo Fundo e explicou como funcionava o processo para receber, processar, armazenar e despachar as safras nesses espaços. Hoje com 75 anos, Iaione conta que frequentava os caminhos subterrâneos quando adolescente, ajudando na operação. Segundo ele, naquela época o que mais passava por ali eram sacos de feijão.
— O produto caía na esteira e era transportado até o destino. Por exemplo, uma esteira transportava os sacos para o moinho, para descarregar o grão, enquanto outra levava para o silo, para depositar — contou Iaione, apontando para esteiras que ficavam no chão e outras suspensas em uma parte mais alta.
A família Iaione repassou o complexo do moinho à Cooperativa Tritícola de Passo Fundo (Coopasso) em 1971. Quatorze anos depois, em 1985, a entidade declarou falência e fechou suas portas no ano seguinte.
Parte do complexo — o refeitório, armazém em formato de L, duas residências, chaminé industrial, garagem em zinco e dois galpões de madeira — foram demolidos em junho de 1990.
Preservar a história e abrir espaço para o novo
Até ser adquirido e reformado para sediar o Hub Aliança, o prédio foi uma casa noturna, nas décadas de 2000 e 2010. Segundo Casalli, a revitalização do espaço buscou ao máximo preservar a história, mas, ao mesmo tempo, integrar com a tecnologia do mundo moderno.
— Essas estruturas que estão aqui seguraram sementes por muito tempo, que vieram da nossa agricultura e têm muita força. Então trouxemos isso para a preservação desse espaço por mais tempo — pontuou o arquiteto.
Por causa das características técnico-construtivas e arquitetônicas, além do significado do local para a cidade, o moinho e o silo da Avenida Sete de Setembro foram tombados como patrimônio cultural de Passo Fundo em 2011.
Assim como era no século 20, quando os túneis eram a tecnologia mais efetiva para transportar grãos, a Região Norte continua vendo o agronegócio como uma das principais fontes de renda. Por isso, segundo José Luis Turmina, fundador do Instituto Aliança Empresarial, o espaço se mostra especial para quem trabalha nos dias atuais com a economia local.
— Um hub de inovação aqui é colocá-lo no lugar ideal. Podemos aprender com a história, mas abrir a cabeça para as novas oportunidades, tecnologias e formas de se relacionar — pontuou Turmina.