Por Dr. Mateus Possebon Bortoluzzi, coordenador do curso de Agronomia da Universidade de Passo Fundo (UPF)
Nos últimos anos, o Rio Grande do Sul enfrentou sucessivas quebras de safra devido ao déficit hídrico, causado principalmente pela escassez de chuvas e pela falta de água no solo para suprir a demanda das plantas. Mais recentemente, as enchentes trouxeram danos catastróficos tanto ao meio rural quanto às áreas urbanas.
Embora esses fenômenos extremos não sejam inéditos, observa-se uma intensificação em sua magnitude e frequência, especialmente quando se amplia a análise para outras regiões do Brasil e do mundo.
O solo, um dos principais pilares dos sistemas de produção agrícola, foi gravemente degradado pelas enchentes. Em algumas áreas, houve erosão significativa da camada superficial; em outras, ocorreu a deposição de sedimentos de diferentes origens. Em ambos os casos, a depreciação das características químicas, físicas e biológicas do solo foi expressiva, comprometendo o potencial produtivo, cuja recuperação pode levar anos.
Nesse contexto, foi realizada em Passo Fundo, de 15 a 17 de setembro, a 15ª Reunião Sul Brasileira de Ciência do Solo, com o tema "Sustentabilidade do Sistema Solo-Planta". No evento, promovido pelo Núcleo Regional Sul da Sociedade Brasileira de Ciência do Solo (NRS-SBCS) e organizado em conjunto com a UPF e a Embrapa Trigo, discutiram-se amplamente os sistemas de produção e as práticas agrícolas voltadas à melhoria da qualidade do solo.
A reunião foi de grande importância para o avanço da ciência, para nortear políticas públicas e fomentar o uso de informações técnicas entre profissionais do setor como técnicos, extensionistas e produtores.
Não há soluções mágicas para os desafios que enfrentamos
O “básico bem feito” continua sendo enfatizado, mesmo em um encontro que reúne alguns dos maiores especialistas em Ciência do Solo. Ressalto que fazer "o básico bem feito" é uma tarefa complexa e trabalhosa, que exige profundo conhecimento e adaptação a cada realidade.
Entre os principais aspectos do manejo adequado do solo estão o mínimo revolvimento, a manutenção constante da cobertura vegetal e a rotação de culturas, de forma a intensificar os modelos de produção.
O diagnóstico preciso e a correção química adequada do solo, o entendimento da biologia e microbiologia do solo — especialmente com o crescente uso de bioinsumos — e a melhoria das propriedades físico-hídricas são essenciais.
Essas práticas favorecem o aprofundamento das raízes, além de aumentar a infiltração e o armazenamento de água no solo. Além disso, sempre que necessário, é essencial adotar outras práticas conservacionistas, como a semeadura em contorno e o terraceamento, e, quando possível, ampliar a captação de água e o uso da irrigação.
Dessa forma será possível mitigar significativamente as perdas causadas por estiagens, bem como pelos excessos de chuva, promovendo o aumento da produtividade agrícola.
As oscilações climáticas naturais, potencialmente intensificadas pelo aquecimento global, tornam ainda mais urgente a adoção dessas práticas. Para a próxima safra de verão, o International Research Institute for Climate and Society (IRI) e o Climate Prediction Center (CPC) indicam uma probabilidade superior a 80% de ocorrência do fenômeno La Niña no trimestre de outubro a dezembro, o que pode resultar em chuvas abaixo da média.
Nesse cenário, a melhoria do Sistema Solo-Planta torna-se fundamental para aumentar a resiliência das atividades agropecuárias frente a condições adversas, contribuindo diretamente para a sustentabilidade de toda a cadeia produtiva.
Mateus Possebon Bortoluzzi é professor, doutor em Agronomia e coordenador do curso de Agronomia da Universidade de Passo Fundo (UPF). Entre em contato através do e-mail mateusbortoluzzi@upf.br.