Merece ser reverberada no país a discussão que nos últimos meses ganhou nova força, em especial nos EUA, sobre o uso excessivo de redes sociais por crianças e adolescentes. O tema deve ser acompanhado com atenção por autoridades brasileiras, profissionais da área de saúde, educadores e pais.
O assunto reacendeu a partir da publicação do livro A Geração Ansiosa, do psicólogo social Jonathan Haidt, professor da Universidade de Nova York. Haidt alerta para uma epidemia de problemas de saúde mental entre a população infantil e os jovens norte-americanos, que se repete em outras nações analisadas. Aponta alta de 50% nos casos de depressão entre crianças e adolescentes de 2010 a 2019 e de 48% nos suicídios. O período inicial marca a popularização dos smartphones, que facilitaram o acesso às redes. A principal advertência é para que os país façam o possível para evitar que seus filhos cresçam na frente das telas, à mercê dos algoritmos.
Na semana passada, a maior autoridade em saúde pública dos EUA, Vivek H. Murthy, classificou o tema como uma emergência
Na semana passada, a maior autoridade em saúde pública dos EUA, Vivek H. Murthy, classificou o tema como uma emergência. Referiu a responsabilidade das redes sociais, consideradas viciantes. Em um contexto de cuidados das empresas de tecnologia muito aquém do necessário em relação aos conteúdos que deixam circular e de estímulo à permanência online pelo maior tempo possível, Murthy sugeriu que o Congresso dos EUA forçasse as companhias a alertar os usuários sobre os riscos existentes nas redes. Seria algo semelhante às advertências nas embalagens de cigarros. Para Murthy, trata-se de um problema tão grave que não caberia apenas aos pais a tarefa de limitar o acesso de crianças às redes sociais. Seria uma missão coletiva da sociedade.
Não é nova a associação entre uso desmedido de redes sociais por crianças e adolescentes e transtornos mentais, além de dificuldade de sociabilidade e de aprendizado. Mas ainda existem questionamentos. Holden Thorp, editor da revista científica Science, uma das publicações do gênero mais respeitadas do mundo, avaliou em artigo na semana passada que Haidt não conseguiu demonstrar a relação de causa e efeito.
Dúvidas devem servir para incentivar mais debates e estudos. Os problemas de saúde mental entre crianças e adolescentes também avançam no Brasil. De 2011 a 2022, as taxas de suicídio e automutilações na faixa etária entre 10 e 25 anos cresceram muito acima da média da população em geral, indicou pesquisa da Fiocruz. Em meio a essas preocupações, ganha adesão no país a ideia de evitar dar celular a crianças com menos de 14 anos e só permitir redes sociais após os 16, em linha com a pregação de Haidt. A iniciativa é defendida pelo movimento Desconecta, nascido de um grupo de mães preocupadas com o uso precoce dos smartphones pelos filhos. Há ações também de instituições de ensino restringindo o acesso aos aparelhos nas escolas.
O tema deveria estar na ordem do dia do Congresso Nacional. O parlamento, no entanto, segue omisso quanto à regulação das redes sociais.