Por Gabriela Ewald Richinitti, advogada e escritora
Carlos Eduardo Richinitti, desembargador do TJRS
A regulação das redes sociais representa um desafio que só não é maior do que a urgência de enfrentá-lo. Sejamos realistas: as redes hoje ameaçam grandes conquistas civilizatórias, acenando com um instrumento para a derrocada da própria civilização.
Certos problemas exigem soluções tão complexas que o propósito de enfrentá-los não deve ser examinado à luz dos riscos da intervenção, mas das potenciais consequências de nossas acovardadas omissões.
Em sua gênese, as redes sociais pressagiavam um mundo melhor: prometiam aproximar pessoas, difundir informação e conhecimento, encurtar distâncias, diferenças e tempo. Nas atuais circunstâncias, contudo – com o lucro sendo praticamente o único norte regulador –, o que vemos é a antítese de toda essa utopia.
Democracias sólidas, mundo afora, assistem ao estremecimento de suas bases, quando não sua queda. A divulgação desmedida e orquestrada de discursos de ódio, fomentada por notícias falsas, aloca o poder nas mãos dos extremistas. A grande maioria – os moderados, se poderia dizer – já não tem direito de escolher, limitando-se a aderir ao que lhe parece menos ruim.
Em nome da irrestrita liberdade, arma-se um palco confortável à prática de todo tipo de crime
Em nome da irrestrita liberdade, arma-se um palco confortável à prática de todo tipo de crime. Odiosos racistas já não mais se escondem. Organizações criminosas, quando não terroristas, encontraram espaço fértil para suas atividades. Vigaristas da fé por ali enriquecem, jovens tiram a vida pelo ciberbullying, ditadores atômicos ressurgem e, com eles, o temor da última grande guerra
A liberdade de expressão é garantia inegociável de qualquer democracia. Suas balizas, no entanto, foram postas para uma realidade prescrita e já não servem para este mundo vitual – que precisa sofrer uma regulação compatível com seu poder e alcance.
Regular não é, e nem pode ser, sinônimo de censura – essa constatação demarca o tamanho do desafio, mas não pode justificar a completa recusa a seu enfrentamento. Inadmissível que se deixe tudo como está, permitindo que as regras sejam ditadas basicamente pelo lucro e pelo poder de quem enriquece mais propagando o mal do que o bem.