O mal causado à atividade pelo juro alto é bem ilustrado por um levantamento publicado na edição de segunda-feira do jornal Valor, especializado em economia e negócios. Informações colhidas em balanços de 386 empresas de capital aberto e não financeiras indicam que o gasto com o pagamento de juros em 2023 chegou a R$ 306,8 bilhões, um acréscimo de 8% ante o exercício anterior, superando os montantes direcionados a investimentos, R$ 298,7 bilhões. Em 2022, os valores aplicados nas atividades dessas companhias eram maiores do que as despesas financeiras.
O risco é estar se penhorando o crescimento econômico dos próximos anos
O Banco Central (BC) manteve a taxa Selic no ápice de 13,75% ao ano entre agosto de 2022 e o mesmo mês do ano passado. Iniciou o ciclo de corte em setembro. Apesar do começo do afrouxamento, as empresas ainda sentiram os efeitos do aperto. A política monetária tem efeitos defasados no tempo. Quando as empresas têm de destinar mais dinheiro para pagar juro, menor é a disponibilidade – e a própria disposição – para investimentos produtivos. A prioridade é proteger o caixa. Isso afeta o potencial de crescimento da economia no médio e no longo prazo e, por criar gargalos, também gera riscos inflacionários.
É uma circunstância que explicita a importância de o país fazer a sua parte para produzir condições estruturais favoráveis a uma redução do juro a patamares razoáveis. Ainda ontem, o BC publicou a mais recente edição do Boletim Focus e as estimativas do mercado para a Selic ao final do ano subiram de 9,13% para 9,5%. A variação é significativa para o intervalo de uma semana. As expectativas no Focus costumam se mover de forma mais lenta. Por óbvio, entre as razões estão as tensões geopolíticas e a demora maior do banco central norte-americano para iniciar o seu ciclo de corte do juro. Mas também reflete a piora das perspectivas fiscais do Brasil, após a desistência do governo federal de gerar superávit em 2025.
Uma boa notícia para o Planalto veio da arrecadação de março. Alcançou R$ 190,6 bilhões, recorde para o período e uma alta real de 7,22% ante igual mês do ano passado. Mesmo assim, nota-se uma desaceleração em relação a fevereiro, o que já era esperado, confirmando as projeções de que o governo continuará longe das metas fiscais se insistir apenas em medidas arrecadatórias. Para este ano, o objetivo oficial, cercado de ceticismo, ainda é zerar a diferença das colunas de despesas e receitas.
Deve-se outra vez insistir na necessidade de cortar e racionalizar gastos para alcançar a sustentabilidade das contas do país e evitar uma trajetória perigosa da dívida pública no futuro, o que se traduziria em juros mais restritivos e economia cambaleante. Não é algo abstrato. Afeta a vida de todos os cidadãos.
O secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan, voltou a acenar nesta semana com revisão de despesas e busca por eficiência nos gastos. Mas foi evasivo ao ser questionado sobre medidas efetivas. A ministra de Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, Esther Dweck, periodicamente cita uma proposta de reforma administrativa. Mas é uma agenda que não avança no governo ou empolga o núcleo do poder. Quem manda, afinal, é o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que ontem voltou a reclamar das críticas sobre gastos do Executivo. Sintomático. Para completar, há as incertezas das pautas-bomba gestadas no Congresso.
Tudo isso somado eleva a desconfiança e pressiona os juros futuros. O risco é se estar penhorando o crescimento econômico dos próximos anos.