Ely José de Mattos, economista e professor da Escola de Negócios da PUCRS
A SXSW deste ano, uma das maiores feiras de inovação do mundo, trouxe fortemente na sua pauta a felicidade como um elemento fundamental para o bem-estar das pessoas e o aumento da produtividade. Sobre isso, dois elementos me chamam atenção.
Estar feliz tem a ver com estado de espírito e todas as suas repercussões
Primeiro, a relação entre felicidade e bem-estar não é novidade. Antes de Cristo, Aristóteles, em sua obra Ética a Nicômaco, discute felicidade, classificando-a como o maior bem humano a ser alcançado, o que a tornaria, neste contexto, um princípio ético. Além de discutir sua própria definição e apontar que ela pode variar entre as pessoas, boa parte do seu texto discute como alcançar a felicidade – sendo que ela ser um fim em si mesma significaria a forma mais elevada de vida, devendo ser encontrada de dentro para fora, como essência e não mera consequência do meio externo.
Associar felicidade com sinônimo (ou quase) de bem-estar é simplista. Estar feliz tem a ver com estado de espírito e todas as suas repercussões. Gozar do que chamamos de “bem-estar” tem a ver com felicidade, claro, mas não necessariamente é sua materialização. Mais modernamente, filósofos como Schopenhauer e Nietzsche, por exemplo, também dedicaram partes significativas de suas obras discutindo a felicidade. Ainda que seus apontamentos sejam diferentes, compartilham da ideia de que a felicidade suprema é individual, íntima, ligada a valores, desejos e intelectualidade de cada um.
Meu segundo ponto é sobre a produtividade. Parte-se da lógica de que “colaboradores felizes são mais produtivos”. Não imagino que esta ligação cause surpresa a alguém. De todo modo, na esteira da evolução das relações de trabalho, hoje estamos sedimentando a ideia de que trabalhadores que se sentem felizes tendem a trabalhar melhor e produzir mais e logo, “felicidade” seria uma espécie de energético psicológico a ser prescrito aos colaboradores.
No entanto, há que se ter cuidado com a ordem dos fatores. O trabalho é apenas um pilar na busca por felicidade, que é pessoal, íntima, intelectual. Este trabalho deveria, idealmente, associar-se a esta busca individual, que compõe o sentido da vida. A felicidade não se presta a ser insumo de produtividade. Ela é, nisto acredito, a balizadora das decisões e do comportamento humano – que podem, ou não, levar ao aumento da produtividade. Ela é sempre fim, nunca meio.