Alfredo Fedrizzi, conselheiro e consultor
Há poucos dias resolvi ouvir alguns podcasts gravados no início da pandemia. Queria escutar o que especialistas de comportamento humano pensavam sobre o que poderia acontecer com as pessoas depois do período da covid. As opiniões são diversas, mas grande parte acreditava em uma transformação das pessoas. O otimismo e a idealização desta mudança eram enormes. Sairíamos para um mundo melhor. Uma economia que não mais exaurisse os recursos do planeta. A terra seria menos poluída, e as pessoas respeitariam mais umas às outras depois do susto causado pela doença.
A quarentena, como na Bíblia, serviria para nossa purificação e nossa transformação. Haveria um novo renascimento, com indivíduos mais conscientes sobre humanidade e vida. A crise nos levaria a caminhos novos. Uma idealização semelhante à que havia quando a internet e o celular entraram no nosso cotidiano. A previsão era de que íamos trabalhar menos e ter mais tempo para desfrutar a vida. Mas aconteceu o contrário. Passamos a trabalhar mais, de todos os lugares, com prazos de respostas e entregas mais curtos, gerando mais estresse.
Terminada a pandemia, só ficaram as promessas de mudança
Terminada a pandemia, só ficaram as promessas de mudança. O mundo passou do estado covid para o estado caótico. Estamos lidando com questões que acontecem lá fora e refletem dentro de nós. As pessoas estão tendo crises de ansiedade com tantas catástrofes, guerras, retrocessos, conflitos de todos os tipos. Continuamos destruindo o meio ambiente e a nós mesmos.
Em muitos países a democracia perde espaço e a tirania cresce. Algumas até travestidas de democracia. Não sabemos mais no que e em quem acreditar tal a quantidade de versões – muitas mentirosas – de quase tudo o que acontece. Temos diante de nós mais uma guerra, a de narrativas. Perdemos o foco diante de tantos palpites, alguns de uma irresponsabilidade assustadora. Estamos diante de um futuro cada vez mais incerto.
Ninguém tem ideia de quando tudo isso vai parar. O filósofo Italiano Antonio Gramsci dizia que “O velho mundo está morrendo, o novo demora a nascer. Neste claro-escuro, surgem os monstros”. Os episódios das últimas semanas nos convidam a olhar para dentro e revisar nossos ideais, atitudes e crenças. Os monstros estão surgindo de todos os lados, sem escrúpulos. O que vamos fazer? Continuar idealizando que quando esse caos passar tudo vai melhorar?
Acredito que para mudar precisamos querer. E para querer e estimular a mudança é necessário um grande desapego – do poder, de velhas crenças de que somos donos da verdade e das nossas teorias sobre o que pensamos e achamos que é o melhor para o mundo. Precisamos olhar para o outro não como um inimigo a ser derrotado a qualquer custo, mas como alguém com quem precisamos negociar e falar de solidariedade e de paz, exercendo a nossa humanidade. É exigente? É! Mas só assim conseguiremos sair do caos em que a ambição pelo poder nos jogou.