Uma das boas notícias globais dos últimos meses é a redução dos preços das commodities agrícolas, após os picos observados no início da guerra no Leste Europeu. Com o começo do conflito, produtos como trigo e milho atingiram cotações que não eram vistas há mais de uma década pelo fato de a Ucrânia estar entre os principais produtores e exportadores globais dos dois grãos. Além de colheitas menores, temia-se a impossibilidade de escoamento devido ao controle russo dos portos no Mar Negro. Um acordo mediado pela Organização das Nações Unidas (ONU) e pela Turquia, no entanto, destravou os embarques e, também devido a outros fatores do mercado internacional, as cotações recuaram significativamente nos últimos meses.
O ideal é que Moscou e Kiev cheguem a um novo acordo que restabeleça a previsibilidade no escoamento dos grãos ucranianos
Foi uma colaboração importante para o processo de desinflação global. Os preços do trigo na bolsa de Chicago caíram pela metade em relação a negócios registrados logo que a Rússia invadiu o país vizinho. Os russos, é preciso lembrar, são os maiores exportadores mundiais. No caso do milho, a desvalorização foi de cerca de 40%.
Esse alívio, agora, está em risco. Avaliações mais definitivas são prematuras, mas o anúncio do Kremlin no início da semana de que não renovará o acordo tem o potencial de levar a uma nova valorização de alguns grãos por dificultar as exportações da Ucrânia, importante produtora também de cevada e girassol. Desde então, as cotações do trigo subiram aproximadamente 10% e as do milho, em torno de 15%.
Observadores do mercado não esperam uma disparada semelhante à notada na largada da guerra. Mesmo assim, não se descarta que, caso o impasse persista, os preços subam de forma mais firme. Isso prejudicaria o processo de acomodação geral dos preços, inclusive no Brasil, onde os alimentos – após um período de forte alta para os consumidores – têm sido um dos principais fatores a suavizar os índices inflacionários. É uma das razões que devem permitir o início do ciclo do corte de juro no país pelo Banco Central, esperado para o início do próximo mês.
Os grãos em questão têm várias finalidades. O trigo é o ingrediente principal de pães, massas e biscoitos. O milho é usado para óleos e rações. Sua alta pode voltar a pressionar os custos das cadeias de proteína animal, hoje também penalizadas pela retração da demanda doméstica e internacional, com reflexos nos preços pagos aos criadores. É um contexto que tem levado a uma crise em setores como a suinocultura, sustento de milhares de produtores do Estado.
Os agricultores brasileiros, por outro lado, podem ser pontualmente beneficiados. Os gaúchos em especial no caso do trigo, já que o Rio Grande do Sul lidera a produção nacional desse cereal.
No balanço entre ganhos e perdas, há mais pontos negativos. É preciso levar em conta ainda que uma escalada dos preços de commodities agrícolas eleva a insegurança alimentar no mundo, notadamente nos países mais pobres. O ideal, por conseguinte, é que Moscou e Kiev, com o auxílio de outras nações e organismos internacionais, cheguem a um novo acordo que restabeleça a previsibilidade no escoamento dos grãos ucranianos.