Por Gabriela Ferreira, consultora em inovação e professora da PUCRS
A Copa do Mundo do Catar será a mais sustentável do mundo, eles disseram. Esse foi o desafio que a Fifa impôs ao comitê organizador em 2020, e todos os projetos deveriam atender a elevados padrões de sustentabilidade focando na neutralidade das emissões de carbono.
Segundo a gerência de sustentabilidade da Fifa, entre 70% e 80% dos estádios foram construídos com materiais reciclados, especialmente as fundações, tem até 40% de iluminação LED, capacidade de conservação da água e energia solar. O Estádio Ras Abu Aboud, por exemplo, é o primeiro estádio totalmente desmontável na história da Fifa World Cup, podendo ser usado no futuro para outros projetos esportivos.
Há mais questões na sustentabilidade do que apenas a dimensão ambiental
Outra forma de atingir o objetivo era tornar a Copa a mais compacta já realizada. O fato de o Catar ser um país pequeno, com 11.437 quilômetros quadrados, pouco mais da metade do menor Estado brasileiro, Sergipe, ajudou bastante: a maior distância entre os estádios é de 50 quilômetros. As delegações e os torcedores podem, chegando ao país, ficar sediados em um único local, deslocando-se em pequenas distâncias para os jogos. Assim, a redução das emissões de carbono vai acontecer pelo uso de trens e ônibus, sendo que cinco dos estádios estão conectados ao metrô de Doha e os outros três são acessíveis por meio de ônibus.
No entanto, segundo relatório divulgado, ainda em maio de 2022, pela ONG Carbon Market Watch, o Catar estaria falhando no objetivo de ser um evento de carbono neutro. E, mesmo que não estivesse, há mais questões na sustentabilidade do que apenas a ambiental, e parece que esta Copa do Mundo tem diversos problemas com a dimensão social. A Organização Internacional do Trabalho e a Anistia Internacional investigam o que seriam milhares de mortes de imigrantes que trabalharam na construção da infraestrutura da Copa. O país nega, a Fifa diz que não há registros, mas isso não é de hoje: investigação do jornal britânico The Guardian indica que pelo menos 6,5 mil trabalhadores imigrantes morreram no Catar entre 2010 e 2020. Os problemas sociais no país não são novos, e por conta de violações de direitos humanos e trabalhistas, vários artistas, inclusive, negaram convites para apresentações na Copa.
É louvável a intenção de um megaevento planetário carbono neutro, se é que, de fato, isso foi concretizado. Porém, não há construções sustentáveis, eficiência energética e mobilidade urbana inteligente que dê conta da sustentabilidade quando o social está claramente ameaçado.