Alterações no sistema de impostos são sempre sensíveis devido à complexidade e à variedade de interesses envolvidos. Mas, mesmo ciente do quanto o tema é intrincado, o governo federal apresentou, na segunda fase de sua reforma tributária, uma proposta de mudanças no imposto de renda para pessoas físicas e jurídicas sem a necessária transparência nem cálculos claros para justificar as alterações. Como após as primeiras análises concluiu-se que se aumentaria de maneira significativa a carga sobre as empresas, muitas já debilitadas pela pandemia, os protestos fizeram o Planalto ceder, mas ainda não de uma forma adequada.
O governo terá agora de participar ativamente no Congresso da costura de um texto equilibrado, com projeções claras e didaticamente explicadas
Vai na direção correta o texto do relator do projeto na Câmara, Celso Sabino (PSDB-PA), no sentido de reduzir alíquotas de IRPJ e aliviar a mordida para as companhias. Afinal de contas, é quem move a economia e gera a esmagadora maioria dos empregos. Mas foi mantida uma oneração maior especialmente para a classe média, que pagará a conta do alívio para parte dos estratos inferiores, como a ampliação da faixa de isenção do IRPF. É falsa a dicotomia entre o tratamento dado a empresas e a cidadãos. A população, de maneira semelhante ao mundo empresarial, é parte essencial para a atividade econômica, tanto pelo consumo quanto pela poupança.
Se é correta a suavização da proposta para as empresas, que já investem energia e custos demasiados apenas para apurar o que têm de recolher, é equivocado apertar ainda mais o torniquete sobre o bolso da classe média, que também não vive dias de pujança, dadas a magnitude e a duração da crise dos últimos anos. Assim, a solução definitiva ainda precisará ser encontrada, somando-se a medidas que existem na maioria dos países do mundo, como a taxação de dividendos.
Como abriu mão de uma verdadeira reforma tributária, com a unificação de vários impostos federais, estaduais e municipais, que traria ganhos de eficiência e custos, o governo terá agora de participar ativamente no Congresso da costura de um texto equilibrado, com projeções claras e didaticamente explicadas, mas principalmente que traga maior justiça tributária, sem asfixiar o setor produtivo e as classes médias. Novas recalibragens serão necessárias, como se vê. Ao mesmo tempo, o Executivo deve tratar de mexer na essência da máquina pública, sustentada pelos tributos recolhidos da sociedade, hoje exageradamente pesada e ineficaz. As saídas têm de ser buscadas nas colunas da receita e da despesa.