O assassinato do presidente do Haiti, Jovenel Moïse, alvejado por tiros na casa onde morava, levanta dúvidas sobre a eficiência intervenções estrangeiras no país. Mesmo que bem-intencionadas, as missões da Organização das Nações Unidas (ONU), nas quais o Exército brasileiro teve papel de protagonismo, não conseguiram dar às instituições da nação caribenha, a mais pobre das Américas, uma mínima solidez democrática.
Construir uma democracia requer tempo, paciência e capacidade de aprendizado e, quanto mais fracos forem seus pilares, mais fácil será colapsá-la
Já no final do século passado, uma invasão americana, motivada pelo desejo de barrar a imigração ilegal de haitianos para a Flórida, se propunha a levar paz e estabilidade à região, oprimida por ditaduras, pela estagnação econômica e, mais tarde, por um terremoto que colapsou definitivamente a frágil infraestrutura do país, além de ceifar milhares de vidas.
Não se trata aqui de desmerecer o papel das Forças Armadas brasileiras, que ao longo de 13 anos certamente impediram mortes e alavancaram oportunidades para a população local, e sim de constatar que blindados e armas não bastam para reconstruir um país. Somente um investimento consistente e de longo prazo em educação é capaz de criar um ambiente com um mínimo de organização social, política e econômica.
Por outro lado, é imprescindível destacar que o assassinato na residência oficial do presidente e da primeira-dama do Haiti, que sobreviveu ao ataque na madrugada de ontem, expõe, de forma brutal, os perigos da radicalização política. Seria um exagero traçar, por enquanto, qualquer paralelo com o Brasil, que tem instituições sólidas, independentes e atuantes. Mas os recentes episódios em Porto Príncipe confirmam que a erva daninha da polarização exagerada precisa ser arrancada pela raiz, para que não se espalhe e não fuja do controle dos mecanismos democráticos.
Respeito ao voto, à liberdade e à divergência são elementos centrais desse processo. No caso do Haiti, a tentativa de conter a hemorragia não conseguiu curar a doença, que se chama pobreza extrema, violência política, corrupção e falta de investimentos em escolas e em professores. Que a covardia dos que matam pelo poder e os insucessos das tentativas de intervenção sejam um sinal de alerta para todos os países da região. Construir uma democracia requer tempo, paciência e capacidade de aprendizado. Quanto mais fracos forem seus pilares, mais fácil será colapsá-la.