São inquietantes as reiteradas demonstrações de incapacidade do presidente Jair Bolsonaro de compreender como funcionam os mercados e os riscos para o país de intervenções populistas em empresas estatais. Bolsonaro se elegeu admitindo ser um ignorante em temas econômicos, mas após dois anos de mandato já deveria ter aprendido que canetaços não resolvem problemas complexos. Pelo contrário, costumam agravá-los. A conta, como sempre, acaba apresentada a toda a população, como bem sabe Paulo Guedes, o ex-superministro da Economia que o presidente prometeu sempre ouvir, mas do qual hoje, na prática, desdenha.
As consequências do ressurgimento dos instintos do presidente não vão afetar apenas quem investe no mercado financeiro
A previsibilidade desejada por Bolsonaro, como no caso dos combustíveis, só é possível em ditaduras e, mesmo assim, os efeitos nefastos de tentativas de controlar preços, mais cedo ou mais tarde, se sobrepõem aos artificialismos. Nos mercados, a regra do jogo é formada por fatores como oferta e demanda. O petróleo, como commodity internacional, flutua ao sabor da economia. E, enquanto o mundo cresceu 30% na última década, o Brasil ficou estagnado (2%), mostram cálculos do FMI.
A outra face dessa moeda é o dólar. Diante das ameaças de abandono da responsabilidade fiscal, das constantes crises políticas e institucionais, da hesitação em reformas, demora na aquisição de vacinas e de arroubos autoritários e populistas, não é surpresa que o real seja o campeão mundial de desvalorização. Nestes termos, não há como dar certo.
A intervenção de Bolsonaro na Petrobras, com a iminente saída de Roberto Castello Branco da presidência da estatal, começa a custar caro, como se imaginava. A tentativa desesperada de buscar recuperar popularidade e atender a categoria dos caminhoneiros, despindo-se dos últimos fiapos da fantasia liberal, já fez estragos profundos ontem, com alta do dólar, dos juros futuros e disparada do risco país, enquanto os papéis preferenciais da petroleira na B3 derreteram 21%. O mesmo aconteceu com o Banco do Brasil, com queda de 11%, pelas especulações de que o presidente da instituição pode ser a próxima vítima da degola. No fim de semana, Bolsonaro ameaçou ainda "meter o dedo na energia elétrica", lembrando outra vez a gestão Dilma Rousseff.
As atitudes intervencionistas do chefe do Executivo geraram novas rodadas de calafrios nos verdadeiros liberais que o apoiaram na campanha. Mas é difícil alegar espanto se o presidente só está agindo de acordo com as ideias que sempre expressou como deputado, abandonando-as parcialmente apenas no período eleitoral, quando era conveniente. As consequências do ressurgimento dos instintos do presidente não vão afetar apenas quem investe no mercado financeiro. O que nunca deu certo não dará de novo. Os resultados tendem a ser a contaminação da economia real, com atividade mais lenta, freio nos investimentos produtivos, maior desconfiança de empresários e consumidores, aumento de juros e da inflação e dificuldade de melhora dos indicadores de emprego. Com o sinal ideológico trocado, o Brasil cada vez mais se aproxima das práticas comuns em países odiados por Bolsonaro e pelo seu entorno.