Pressionado pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o governo federal enfim apresentou um plano preliminar para a vacinação contra a covid-19, provavelmente a partir do primeiro trimestre de 2021. O planejamento ainda pode ser aperfeiçoado de acordo com sugestões que se mostrarem lógicas em termos de grupos prioritários ou distribuição regional, mas é preciso ser saudado o fato de a população passar a conhecer os passos pretendidos pelo Ministério da Saúde, assim que o país tiver um produto aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e existir volume suficiente para deflagrar o processo. Conhecer agora as intenções do governo permite ainda que exista um bom tempo hábil para que especialistas analisem a proposta e, se for o caso, indiquem possíveis melhorias no plano.
O Programa Nacional de Imunizações do Brasil é referência mundial e espera-se que siga norteado por critérios técnicos
O positivo é que, a partir de um primeiro olhar, observa-se que as linhas gerais do planejamento obedecem às diretrizes da Organização Mundial da Saúde (OMS) em relação à preferência de determinados estratos populacionais, de acordo com critérios de risco ou exposição. Com quatro fases previstas, o programa se inicia com profissionais de saúde, idosos a partir dos 75 anos, indígenas e pessoas com mais de 60 anos que vivem em asilos ou instituições psiquiátricas. Nas etapas seguintes, os demais indivíduos entre 60 e 74 anos, portadores de comorbidades, professores e forças de segurança, entre outros. É acertado dar a preferência aos mais vulneráveis e a quem está na linha de frente e, dentro dessa premissa, há especialistas que aconselham priorizar também trabalhadores da área de transporte e algum critério social, uma vez que os mais pobres têm índices de mortalidade maior no Brasil. De qualquer forma, como informou o Ministério da Saúde, o plano é preliminar e, portanto, sujeito a ajustes.
O Programa Nacional de Imunizações do Brasil é referência mundial e espera-se que siga norteado por critérios técnicos, e não políticos. Será necessária uma intensa campanha para incentivar a vacinação, sem mensagens que gerem desconfianças na população. O governo tem ainda de correr para definir quais vacinas irá adquirir, com prazos de entrega e volumes compatíveis com as necessidades. São reais as chances de que o produto desenvolvido pela Universidade de Oxford e pela farmacêutica AstraZeneca, grande aposta do Brasil, atrase por falhas na comunicação dos resultados. Será preciso contar com mais de um fornecedor e, hoje, o país tem garantidos por acordo 142 milhões de doses, sendo 100 milhões por meio da parceria da Fiocruz com Oxford e AstraZeneca e 42 milhões previstos pelo consórcio Covax, liderado pela OMS. Insuficiente, portanto.
Vacinas aprovadas cujos fabricantes assegurem entrega em quantidades que atendam às demandas nacionais não podem ser discriminadas simplesmente pelo país de origem. Também chegou o momento de o governo federal assumir uma coordenação nacional, mantendo diálogo e colaboração com Estados e municípios, sem que eventuais discordâncias políticas ou ranços prejudiquem levar adiante uma tarefa que é, literalmente, vital.
Outro efeito positivo da divulgação do plano pelo Ministério da Saúde é deixar claro para a população que haverá uma fila. Ou seja, nem todos poderão receber a sua dose imediatamente e a vacinação se desenrolará ao longo de 2021. Assim, o início da imunização não significará a possibilidade de abandonar cuidados de distanciamento e de higiene. Será preciso manter a responsabilidade até que o país alcance uma cobertura vacinal que consiga diminuir ao máximo a circulação do vírus, debelando a pandemia no Brasil.