Na busca de indicadores que apontem para uma tendência de recuperação da economia, um sinal positivo para o Rio Grande do Sul vem da construção civil. O setor, um dos mais atingidos pela desaceleração do crescimento e depois pela recessão de 2015 e 2016, ressurge agora com números que mostram um desempenho sensivelmente melhor em relação aos demais segmentos, ao menos na geração de postos de trabalho, amenizando o drama do desemprego, uma das faces mais cruéis da crise desencadeada pela irrupção do novo coronavírus. Reportagem publicada ontem em Zero Hora detectou que, em julho e agosto, a construção civil teve saldo positivo de 2 mil vagas com carteira assinada no Estado.
O pior período das crises sanitária e econômica passou, mas baixar a guarda é um erro que pode custar caro
Mesmo que represente apenas pouco mais de um terço dos empregos formais perdidos entre março e junho, período mais crítico da pandemia, os dados indicam que há uma tendência de criação de postos, solidificando a certeza de que o pior momento ficou no retrovisor, a despeito da série de incertezas que persiste à frente. A indústria gaúcha até abriu mais vagas nestes dois meses, 7,3 mil, mas o número representa apenas 17% dos empregos fechados nos quatro meses imediatamente anteriores. O comércio e a agropecuária, da mesma forma, apresentam recuperação, com contratações superando demissões no saldo de julho e agosto, mas em velocidade menor. Somente os serviços, ramo de maior peso na economia, continuaram com dispensas acima das admissões. No total, conforme os dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do governo federal, o Estado recuperou entre julho e agosto somente 9,1 mil dos 134,1 mil empregos com carteira destruídos de março a junho. Nota-se que a recomposição do mercado de trabalho ainda vai demorar.
A manutenção da tendência de melhora, no entanto, depende de uma série de fatores. No caso da construção civil, uma das razões para o bom desempenho está relacionada à queda da taxa Selic, hoje em 2% ao ano, melhorando as condições de financiamento. Para que esse ponto basilar se mantenha e seja sustentável, no entanto, é preciso que o governo federal se desvie de tentações populistas e de gastança e retome a prioridade da responsabilidade fiscal. Caso contrário, como alertam especialistas, o Banco Central, pressionado pelo recrudescimento da inflação e deterioração das contas públicas, será forçado a elevar as taxas mais cedo do que se imagina. A aquisição de um bem que em muitos casos leva vários anos para ser quitado, da mesma forma, é uma decisão que depende da confiança em relação à situação da economia em um horizonte de, ao menos, médio prazo.
A continuidade da retomada gradual das atividades econômicas no Estado e um menor risco de retrocesso também se vinculam à desaceleração da pandemia. Essa conquista deve ser creditada em boa parte à correta orientação da maior parte das autoridades públicas, que estimularam o distanciamento social, o uso de máscaras e outros hábitos, incorporados pela grande maioria da população, que levaram o Rio Grande do Sul a ostentar uma situação até privilegiada em termos de disseminação da covid-19 em comparação com outras unidades da federação e países, a despeito da tragédia de quase 5 mil vidas perdidas. A disciplina e a consciência, portanto, precisam ser mantidas. Vários outros lugares do mundo passam neste momento pelo risco de uma segunda onda pela postura de relaxamento de comportamentos individuais.
O pior período das crises sanitária e econômica passou, mas baixar a guarda é um erro que pode custar caro. Enquanto o planeta aguarda uma vacina segura e eficaz, os gaúchos devem continuar atentos quanto a hábitos e posturas, aperfeiçoando os acertos e aprendendo com os erros para não voltar a ceder terreno à covid-19.