Por Élida Graziane Pinto, procuradora do Ministério Público de Contas do Estado de São Paulo professora da Fundação Getulio Vargas (FGV)
A unificação dos pisos em saúde e educação é promessa falsa de aprimorar sua gestão orçamentária. O que se almeja é deduzir no cômputo de um o que se gasta excedentemente no outro. No limite, o gestor poderia até zerar o gasto educacional para aplicar de forma supostamente prioritária na saúde da população cada vez mais idosa.
Esse jogo de soma zero é inconstitucional e ilusório. Os pisos não só são individuais como também há a garantia de que sejam concursados os professores, o que estabiliza a despesa obrigatória com pessoal ativo da educação, à luz do art. 206, V, da CF.
Por outro lado, é inadmissível reduzir proporcionalmente carga horária e salário dos servidores da educação e saúde nos Estados e municípios em crise fiscal. São serviços públicos essenciais, que não devem ser descontinuados, nem restringidos com o cômputo de inativos nos pisos. Fraudes contábeis não podem acobertar crimes de responsabilidade de alguns prefeitos e governadores.
Mesmo os argumentos de transição demográfica e envelhecimento populacional não se sustentam, diante do déficit de 7 milhões de vagas em creches e da pífia oferta de ensino em horário integral. Tampouco há valorização remuneratória docente efetiva, na forma do art. 206, VIII, da CF. É mesquinho, portanto, falar que há dinheiro sobrando na educação básica obrigatória brasileira, quando chegamos à metade da vigência do PNE com descumprimento de 70% das suas metas e estratégias.
Faltam equipes de saúde da família, mas políticos querem liberdade para gastar mais com hospitais de pequeno porte, por meio de emendas parlamentares desatentas ao planejamento sanitário. O quadro é agravado com demandas judiciais de caráter individual alheias à pactuação federativa que ordena o SUS.
Saúde e educação são subfinanciadas pela União e impera uma guerra fiscal de despesas na federação. Ao invés de esvaziar os pisos, é preciso fortalecer o planejamento setorial de cada área, bem como resguardar que os recursos do fundo social do pré-sal sejam, de fato, fontes adicionais de custeio, diferentemente do que pretende a PEC 188/2019.
Fomentar uma disputa fratricida entre saúde e educação apenas atende ao curto prazo eleitoral de quem deseja inaugurar placas a título de "investimento". O custo dessa escolha é a destruição da garantia de custeio estável e progressivo dos mais nucleares direitos sociais inscritos em nossa Constituição cidadã.