Por Ely José de Mattos, economista e professor da Escola de Negócios da PUCRS
Nesta semana foi divulgada pelo governo uma extensa agenda de reformas, apresentada através de Propostas de Emenda à Constituição (PEC). Dentre as medidas estão o melhor controle do teto de gastos, mudanças na carreira do funcionalismo público, maior flexibilidade na gestão orçamentária. Mas, não quero me deter em nenhuma das medidas em particular – até porquê, seus meandros ainda estão em fase de entendimento e serão fruto de um profundo debate ao longo dos próximos meses. Quero discutir uma pergunta mais básica: estas medidas representam um plano de país? Qual?
No final de semana passada a Folha de São Paulo publicou uma entrevista concedida pelo Ministro Paulo Guedes, onde ele teve a oportunidade de explanar longamente sobre as medidas, que chama de "pacto federativo". Segundo ele, esta agenda propõe uma reforma do Estado. Pelo teor das propostas, é um projeto para afastar o máximo possível o Estado da economia e dar protagonismo ao setor privado, que deve liderar a retomada do crescimento.
Mas, isso não é um plano de país. É tão somente uma mudança do papel do Estado. Até mesmo a retomada do crescimento não é um plano de país. Crescer é apenas um meio para se chegar a algum lugar. Planejar uma nação envolve oferecer, também, respostas consistentes a questionamentos complexos e sensíveis. Que tipo de crescimento teremos? Como ele será distribuído entre pessoas e regiões? Quem ele beneficiará?
Sabemos, por exemplo, que o mercado lida muitíssimo mal com distribuição e proteção social. Mas, o ministro sinalizou que não vê problema nisso: na entrevista, afirmou que os mais pobres passariam a fazer poupança se o modelo de capitalização da previdência tivesse sido aprovado junto com um cenário de legislação trabalhista ainda mais flexível. Um argumento fantasioso que ilustra o tamanho da desconexão com a realidade de um país onde 104 milhões vivem com menos de R$ 413,00 por mês.
Pois é justamente esta falta de conexão com a vida das pessoas o maior indício de que tirar o Estado da economia desta maneira é um projeto isolado, que não pode ser entendido como um plano para o Brasil. Não há consideração séria sobre a totalidade das consequências de tal movimento sobre a população mais pobre – pelo menos não abertamente. O Chile parece ter uma boa ideia sobre a questão. Mas, o ministro acredita que isso é "tolice".