Por Ely José de Mattos, economista e professor da Escola de Negócios da PUCRS
Na semana passada, em sua coluna aqui em ZH, o economista Rodrigo Constantino discutiu a proximidade do movimento feminista com as esquerdas, sustentando que não se estaria mais lutando por direitos iguais entre homens e mulheres. Segundo ele, a chamada terceira onda do feminismo seria um movimento de "ódio aos homens, à família, ao livre mercado".
A partir de alguns exemplos, que transitavam entre Margaret Thatcher, Lula, Marcelo Freixo e a juíza federal Gabriela Hardt, a conclusão é de que as atuais feministas seriam seletivas nas suas causas, ídolos e lutas. Uma seletividade à esquerda. Thatcher não seria idolatrada por ser conservadora; Lula seria poupado por ser de esquerda.
No entanto, não é com exemplos pontuais que um movimento de mais de um século pode ser analisado – muito menos desmoralizado. As duas primeiras ondas do movimento feminista são responsáveis por conquistas fundamentais para as mulheres, como o voto, licença-maternidade, criminalização do assédio sexual no trabalho, Lei Maria da Penha, Lei do Feminicídio, entre outras.
Na terceira onda, além do reforço de pautas antigas, o movimento feminista evoluiu na inclusão de novos atores, como as mulheres mais pobres e vulneráveis, e na especificidade de algumas pautas. Além disso, navega em um cenário de ampla conectividade, no qual as redes sociais ampliam o alcance dos movimentos sociais. Revistas internacionais especializadas, como a Feminist Theory e a Feminist Economics, são fóruns de discussão dessa evolução.
Uma das pautas que vêm de décadas é a questão salarial. Diferente do que Constantino afirma na sua coluna, ainda há diferença de salários entre homens e mulheres para mesmas funções e produtividade – já escrevi sobre isso aqui e aqui.
A literatura econômica está repleta de trabalhos aplicados demonstrando que há um percentual da diferença salarial que não pode ser explicada por características observáveis. Portanto, não é mentira que há indícios de discriminação salarial contra a mulher.
É evidente que existem radicalismos por aí. Existem, claro, no feminismo. São chocantes e não raro depõem contra a causa que julgam defender. Mas são exceções, que não tornam o feminismo um soldado de uma ideologia de esquerda. Até porque radicalismo é um comportamento presente em qualquer ideologia – inclusive na direita, né?!
Feminismo não é de esquerda. Nem de direita. Feminismo é feminismo.