O Supremo Tribunal Federal (STF) volta a analisar hoje a constitucionalidade de prisões após a condenação em segunda instância. Não deixa de causar estranheza a possibilidade de a mais alta corte do país ter um entendimento diferente do decidido três anos atrás, quando definiu ser desnecessário o início do cumprimento de pena em regime fechado apenas após o trânsito em julgado, ou seja, com a confirmação da culpa no terceiro nível do Poder Judiciário e o fim da maratona recursal.
O reexame do STF da prisão após condenação na segunda instância, em tão pouco tempo, demonstra leniência com o crime, na contramão do que clama a sociedade brasileira
Ao voltar à matéria, o STF passa a clara e péssima mensagem de que o principal interesse na retomada do assunto é buscar uma saída que leve à libertação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o mais notório preso da Operação Lava-Jato, condenado por corrupção e lavagem de dinheiro. Casuísmos como esse mancham a imagem do Supremo, que deveria decidir de acordo com os interesses da coletividade à luz da Constituição, e não reinterpretá-la para favorecer envolvidos específicos, famosos ou poderosos – e que contam com meios para contratar os melhores advogados e se valer do excesso de mecanismos protelatórios para tentar escapar das grades. Afinal, é no segundo grau que se encerra a análise das provas, e no terceiro é averiguado apenas se o processo correu dentro da lei.
O reexame do tema em tão pouco tempo demonstra leniência com o crime e favorecimento à impunidade, na contramão do que clama a sociedade brasileira, e tem ainda o peso de criar perigosa instabilidade jurídica. O Brasil precisa de regras claras e sólidas, e não entendimentos legais que mudam ao sabor do vento. Ou, pior ainda, alteram-se de acordo com a figura que pode ser beneficiada ou prejudicada pelas sentenças.
A oscilação do entendimento sobre a prisão em segunda instância não é nova. Em 2009, por 7 a 4, o STF definiu que só poderia ocorrer com o trânsito em julgado. Mas, em 2016, em placar apertado (6 a 5), mudou a jurisprudência, que vale até hoje. O ministro Gilmar Mendes é a personificação da interpretação errática. Em 2009, era contra o recolhimento após decisão no segundo grau. Em 2016 alterou a compreensão e, agora, voltou ao que pensava 10 anos atrás.
O julgamento, que deve ter desfecho após três sessões, eleva o desgaste do Supremo. A ação mais política do que técnica do Judiciário, em qualquer instância, só leva a uma consequência: o temerário crescimento do descrédito de um poder que deveria estar imune a motivações enviesadas e somente ser norteado pela missão de fazer justiça.